O menino com voz

Numa vasta manhã, ouviu-se o canto dos galos, como um brinquedo quase em silêncio.

Voavam alguns pássaros no céu dentro de um vento, que passava em movimento nas árvores descendo manso num morro.

E os raios do sol carregando os homens de asas abertas dentro da caatinga.

Dia que chega com um hálito vexado no coração.

Então, ouviram-se passos pequenos e um suspiro sem voz, feito sombra, bordando levemente os pensamentos do velho Júlio.

Era o menino da vizinha!

Não tinha ainda nove anos, mas há meninos que não sabem calar. E, procurando olhar firme para Seu Júlio, suspirou débil:

_O Senhor vai mesmo cortar a árvore perto do riacho?

O homem experimentou o calor da manhã e andou um pouco mais no caminho. Parou uns passos adiante. E voltou-se para o menino:

_ Bruno, eu não sou um matador de árvores ou animais. Você não entende que a velha árvore está quase caída por sobre o rio? E isso é culpa sua e desses meninos que vivem subindo nela para pular dentro da água.

O menino respondeu prontamente:

_ Eu sei, Seu Júlio! Mas é que nasceu um passarinho na árvore.

Os homens e os meninos. O menino ficou quieto, aguardando a reação do homem, Seu Júlio desmoronou em lembranças infantis, que levantou os olhos cheios de lágrimas para o céu.

_Você tem certeza, Bruno? O que você quer que eu faça?

_ Eu e os meninos vamos deixar de subir na árvore. Deixe-a ficar lá. Deixe que caia, pois sei que vai dar tempo de o passarinho crescer e aprender a voar.

E caminharam calados. O homem em conjecturas e o menino em esperanças.

O vento juntou-se por cima do chapéu de Seu Júlio – “Ei, o chapéu é meu!” – e, enfim, quebrou-se o silêncio.

_ Ah, que você quando quer uma coisa sabe ser insistente; hem, Bruno? Está bem, está bem, eu vou confiar em vocês.

_ O Senhor não vai se arrepender, Seu Júlio!

Disse essas palavras e saiu correndo subindo o morro, porque menino tem uma respiração que se levanta como se os pés voassem.

Isso foi certa manhã, e eu apenas olhava dentro de minhas lembranças: tão longe, tão longe... num tempo, que perdura, no retrato que guardo dentro de mim de meu tio Júlio.

Teresa Cristina flordecaju
Enviado por Teresa Cristina flordecaju em 11/06/2014
Reeditado em 15/06/2014
Código do texto: T4841199
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