O Epitáfio do Doutor Figueira

2 de Janeiro de 1960.

Um estagiário agarrou o Agenor à força no banheiro. Foram surpreendidos pelo Doutor Figueira – o dono da empresa – e um número considerável de colegas, alertados pela gritaria de Agenor. Zelando pela imagem familiar da firma, Doutor Figueira demitiu os dois, com a alegação de conduta imprópria.

Abril de 200...

Faleceu Doutor Figueira, vítima de um ataque cardíaco fulminante.

Um dia nos fins de maio do mesmo ano. Parada gay.

Um velhinho distribuiu centenas de milhares de camisetas na maior parada gay da América Latina. Compadecidos pela grande emoção demonstrada pelo velhinho, meio milhão de pessoas atravessou a Avenida Paulista vestindo curioso uniforme: uma camiseta que trazia, além da foto do falecido Doutor Figueira, o dizer “Figueirinha, nunca te esquecerei”. Foi notícia em todas as emissoras de televisão do país.

No mesmo dia. Residência dos Figueira.

A viúva derramou as cinzas do Doutor Figueira na lata de lixo.

No mesmo dia. Apartamento do Seu Agenor.

— Onde o senhor foi, papai? Demorou. Fiquei preocupada.

— Ah, fui dar meus cumprimentos à viúva de um conhecido.