Eu sem mim

Ainda lembro os gritos agonizantes de minha mãe, os gritos enfurecidos de meu pai. Os pratos e copos quebrando, os móveis se desmontando e tudo indo pelos ares. Era mais uma discussão.

Meu pai costumava beber, segundo histórias contadas por ele, começou a ser alcoólatra logo cedo. Com onze anos já começou a colocar o primeiro gole de cerveja. De pileque em pileque, de caída em caída, hoje ele tem trinta e três e jura que um dia vai parar de beber. Vou dizer que acredito.

Minha mãe sempre trabalhou muito, era ajudante doméstica na casa dos Fagundes, uma família muito prepotente e autoritária. Ela por incrível que pareça já foi ridicularizada e até sofreu preconceito por apenas lavar roupa e secar o chão.

Sou filho único. Minha mãe já abortou umas quatro vezes por causa de tanto nervosismo. A violência dentro de casa era quase constante, acontecia praticamente todos os dias. Se caísse uma pedra no chão ou se houvesse algum mal entendido, já era pretexto para briga.

Esses problemas levo dentro de mim. Não consigo conversar com ninguém, não tenho amigos. Sou uma criança introvertida. Tenho apenas onze anos e vivo neste sofrimento. Não sou rico, venho de uma família pobre, moramos em um barraco que cai aos pedaços, mas nem por isso choro pelos cantos, sou feliz do jeito que eu sou. Acordo com discussão, durmo com discussão, para que? Nem tudo é motivo para tanta violência e injustiça. Com certeza outras crianças presenciam o que vejo todos os dias, sentem o que sinto, veem o que eu vejo.

Quero um dia pelo menos acordar e ver que tudo mudou. Meus pais se entendem e eu realmente serei feliz como sempre desejei. Não é porque moro em uma favela que vou ser cotado como marginal e bandido. Não! Eu estudo para ser alguém na vida, tenho todos os meus direitos, assim como todos os outros tem. Ninguém é igual a ninguém.

Esta é minha realidade, estes são os problemas familiares que sempre estarão guardados em minha memória, ocultos dentro de uma caixinha que se chama coração, onde dentro de uma criança inocente e sonhadora mostra um eu sem mim.

* este texto é apenas uma ficção onde tentei relatar uma visão que tenho sobre o tratamento da sociedade em ambas as partes. Escrito para a aula de Português.

Well Rianc
Enviado por Well Rianc em 01/10/2009
Reeditado em 02/10/2009
Código do texto: T1842040
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