O Susto

As horas quase atingiam a terceira idade quando senti o silêncio se partindo com um estranho sinal de susto atravessar a janela entreaberta. Fiquei por imaginar o que fazer perante um nada convicto de que eu dispunha, e um empenho meio político que assim se fez pela demanda das horas dispensada a uma pouca produção de trabalho. Coisa típica dos dias de domingo.

Talvez por perceber que o silencio era meio que de vidro, fez novo sinal de luta e atravessou, desta vez, com mais nitidez, o desatento a que me convinha naquele instante, fazendo, neste momento, saltar da cadeira empurrando-a para trás. Os passos fúnebres daquela imitação de poltrona ecoaram pelo escritório (ou guarda bagunça?) mudando a tonalidade da indagação do momento, causando terror ainda maior no inimigo oculto que espreitava minha alma naquela hora.

Sendo único humano, esperei com ironia o momento final como que a uma guerra sem motivos viesse a desabar sobre o teto do mundo. Porem, tamanha a especulação, comuns nestes momentos, um terceiro algoz se apodera de minha janela, porta de entrada de um misterioso conjunto, esconderijo perfeito de minhas preces.

E novamente o tormento oculta atravessa o quarto (ou escritório?), arremata-se em luta contra as luzes alertas de minhas horas e é vigiado por seu algoz, mas apenas ouço o que me assusta.

Resolvo apostar em adrenalinas, respiro meio forte meio sono e começo a despedir-me da existência daquela posição e o silencio, mais uma vez é desrespeitado e jogado aos cacos ao chão. Era preciso ter coragem, recobrar a experiência sem tentar entendê-la. Era preciso ir de encontro ao inimigo e não ser vencido por ele. Mas era preciso definir um inimigo primeiramente. Talvez a terceira pessoa, no ato da terceira hora, se beneficie por meus atos. Mas nada mais importava, estava disposto a enfrentar o desconhecido, encarar de frete a situação.

Recebi o sinal em meu olhar quando aquele grilo resolve, pela quinta ou sexta vez, compenetrar meu silencio particular. Demando contra ele, arranco-lhe uma das pernas. Ele havia arrancado-me o sono. Tentei empurra-lo contra a janela de meu mundo ou joga-lo de frente ao seu algoz, aquele réptil fiel que rondava minha porta saída, mas foi em vão. Um vidro sarcástico me impediu.