Galinhas Sagradas, Passarinho Morto

Galinhópolis sempre foi uma cidade pequena e pacata, não era asfaltada e as galinhas consideradas sagradas.

Nenhum galinhopolense poderia ter a ousadia de decapitar sequer uma das aves tão idolatradas.

Na verdade essa idolatria vem com segundas intenções, o rei Jacópodo G. III, seguia a seita familiar que deu início com seu tataravô. Para muitos, essa seita era considerada uma ofensa "donde já se viu tratar galinha como gente", diziam, seguido por um: "galinha não é gente, muito menos Deus...".

O rei por sua vez parecia ignorar comentário desse tipo, e já cansara de explicar que o animal era intocável, e o único que poderia apreciar sua carne e usar suas penas era ele, ou algum membro da família real.

A pena para quem cometesse o "crime" variava de gerações. Na de seu tataravô, por exemplo, era preciso entregar suas ceroulas para o rei, e numa mais usar espécie alguma de cueca. Parecia bizarra a pena, mas num país onde galinhas são sagradas e andam pela rua, era arriscado deixar o passarinho de fora, e as mulheres deveriam ceder sua vaidade às galinhas, como, por exemplo, cortar os cabelos e arrancar as unhas em praça pública, com um alicate que nem dentista chegava perto.

Na geração do querido Jacópodo a pena era mais exótico, independente do sexo, o cidadão tinha no máximo quarenta e oito horas para achar um trevo de quatro folhas para a galinha, caso contrário, corria o risco de perder as unhas, ou o passarinho.

Conseqüentemente numa cidade onde só existem galinhas, era impossível a raça humana procriar, sem trevo, sem unha e sem passarinho... principalmente sem passarinho!

Eduardo Bonine
Enviado por Eduardo Bonine em 30/10/2005
Reeditado em 30/10/2005
Código do texto: T65490