URUÊ ELEGE II

O rapaz terminou todo o ritual, depois virou para nós e sorriu; um riso franco e confortador. A tensão diminuiu em nossos rostos, ainda não estávamos totalmente à vontade, talvez o lugar inspirasse uma forma nova de sentimento, uma espécie de respeito inexplicável.

Ele pediu que sentássemos na toalha estendida, fizemos quase que instintivamente aquele ato, dentro de segundos estávamos formando um círculo sobre ela.

Respirou fundo, sorveu devagar o ar, sentimos seus pulmões trabalhando, tudo parecia loucura, logo eu, uma cética, participando daquilo tudo. Começou a falar, olhando para todas com um olhar inquisidor:

- o que vocês viram? Falem

Queria falar, mas, me recusei a obedecê-lo, gosto de questionar e não de ser questionada. Como nada falamos, ele prosseguiu:

- vocês lindas moças, são muito diferentes entre si, olhem para Marcela – a moça ruiva- o que ela acredita, acredita no sol, na lua, na natureza, no entanto quando vê a natureza se manifestar, fica aí tremendo de medo.

Marcela retrucou:

- não estava com medo da natureza, e sim de você, idiota!

Todas nós concordamos com ela, ele sorriu, contudo dessa vez um riso seco e sarcástico, voltou a falar:

- continuemos, você Camila (a loira), em que acredita? Em um Deus onipresente, piedoso, capaz de tudo pelos seus filhos, no entanto, estava com medo de mim? Um pobre mortal?

Camila segurando uma bíblia protestante, disse:

- meu Deus é sim tudo isso que falaste, Ele é perfeito, mas irmão, eu não sou perfeita! Sou humana e tenho fraquezas humanas, no entanto eu reconheço minhas fraquezas e peço todos os dias para meu Senhor me dar forças.

Ele balançou a cabeça, cobriu os rostos com as mãos, logo em seguida prosseguiu a sua fala:

- e você Maíra (a negra)? Acreditas mesmo nos deuses de teus pais e avós? Ou apenas segues uma tradição? Usa a tua crença para reafirmar os valores de teu povo?

Maíra sorriu, parecia bastante calma nessa hora, e falou:

- eu sabia que irias perguntar isso, tu não és tão imprevisível quanto pensas, sim eu tenho orgulho da minha cor, do meu povo, e da minha religião, mas eu acredito nos nossos deuses e sei que eles me protegem, posso senti-los estão em tudo. Mas isso meu amigo não quer dizer que não creio ou desrespeite o Deus cristão, ou a crença na divindade da natureza, a vida é divina.

Ele começou a suar abundantemente, sua camisa branca estava completamente molhada, mesmo assim prosseguiu:

- bem, sim a vida é divina! Concorda com isso Núbia (a japonesa)? Concorda com a divindade de tudo? Você é católica, acredita mesmo que este crucifixo em teu peito de proteges de algum mal?

Núbia não demonstrou reação nas faces, continuava com uma expressão imparcial, falou tudo com uma voz baixa e áspera:

- sim acredito na divindade das obras de Deus, e esse crucifixo que trago comigo é abençoado sim! e além de me proteger, me ajuda a refletir sempre sobre a grandiosidade do ato que Jesus fez por nós.

Suas faces estavam vermelhas o suor pingava como água do seu corpo. Agora só faltava eu, o que aquele homem iria me dizer? Por que estava ali, em meio a pessoas religiosas? Logo eu que desacreditei em tudo ainda menina?