O catador de papelão ( PARTE lll )
Continua...
No final de cada dia de trabalho, João erguia os braços para o céu e agradecia a Deus com os olhos fixos no horizonte, dizendo que logo deixaria aquela vida porque a sua vitória estava escrita nas estrelas e que logo voltaria para casa.
Vez ou outra, antes do escurecer, eles se reuniam numa pequena mesinha de madeira que João improvisara do lado de fora do seu barraco para tomarem uma cachacinha e bater um dominó. Essa era a única diversão que eles tinham depois de um dia exaustivo de trabalho.
Antes mesmo do debruçar da noite, João despedia-se dos colegas, amornava água numa lata velha de vinte litros, banhava-se, barbeava-se diante de um caco de espelho preso à parede e se recolhia para dentro do pequeno cômodo, onde ele se perfumava, calçava as suas meias novas e vestia o seu terno azul marinho. Puxava de debaixo da cama um par de sapatos pretos nunca antes usados, pousava-os sob o velho tapete, batia os lençóis e deitava-se para dormir.
Esse novo hábito começou a chamar a atenção dos companheiros e lhe rendia perguntas que ele não fazia a menor questão de responder. Ele não dava a mínima para o que pensavam dele. Nem tampouco para os apelidos e as chacotas que começaram a fazer parte do seu dia-a-dia.
As pessoas não entendiam o porquê de um rapaz tão novo, morador de um aterro sanitário, vestir-se de terno para dormir, quando passava o dia separando lixo e vestindo-se de trapos! Muito menos entendiam o porquê e para quem ele escrevia uma carta de tempos em tempos, já que ele era um homem solitário. Mistério esse que eles dariam o que não tinham para desvendar.
Era de tamanha estranheza aquelas manias, porque nem mesmo para ir à cidade ele se vestia daquela forma. Porém, a curiosidade perdurou por muitos anos.
Até que numa manha fria, já passando das oito horas da manhã, José gritou! - Hei! Alguém viu o João? Olhares procuraram ao redor e se voltavam para José em sinal negativo.
...Continua