O DIÁRIO

    Era uma tarde quente, como há muito não fazia naquela cidade. Quinze anos haviam se passado desde então e a velha casa continuava ali, do mesmo jeito de antes, porém, ainda mais velha e abandonada. Ninguém morava mais lá. Os lindos jardins de outrora também já não existiam mais. Só as lembranças perduravam daqueles dias felizes, das brincadeiras ao livre e o alvoroçar das crianças correndo ecoava em meus ouvidos.

    Foi uma infância e uma adolescência repleta de emoções e grandes descobertas.

    Ao me ver ali, parada em frente aquela casa, me perguntei:

    - Por que não entrar e ver o que ainda pode restar daquela época?

    Caminhei lentamente, observando todo o contorno daquela construção que se erguia a minha frente. Hesitei um pouco antes de entrar, mas a curiosidade era mais forte.

    Muita poeira foi o que encontrei, algumas teias de aranhas e um rato passou correndo perto de mim. Tomei um susto, mas continuei a exploração.

    Então lembrei-me do sótão.

    - Aquele sótão guardava muitas coisas interessantes, será que ainda teria algo lá?

    Subi as escadas cuidadosamente até chegar na porta de acesso, a madeira já não estava tão nova e rangia a cada passo dado.

    Quando entrei, me deparei com uma cena que não esperava. Muitos dos objetos ainda do meu tempo estavam lá. Encontrei a velha bola, a boneca que mais gostava de brincar. Era a primeira que havia ganho de meus pais ainda pequena. Muitas e muitas coisas se acumulavam por entre restos de móveis e poeira.

    Então sentei-me na velha cadeira de balanço que minha avô usava quando vinha nos visitar e comecei a mexer nas coisas que estavam em um baú a minha frente.

    Velhas fotos de família num álbum já gasto pelo tempo, algumas lembranças de festas de aniversário... Ah! Essa era especial, a lembrança do aniversário de 30 anos de casamento de meus pais. E fiquei por muito tempo ali, sentada revivendo minhas lembranças.

    De repente, encontrei algo que jurava não estar mais ali, pensava que havia perdido na mudança para nova casa: meu diário. Que felicidade encontrá-lo! Nem lembrava mais o que havia escrito nele. Comecei a folheá-lo, páginas já amareladas pelo tempo, algumas estavam só os pedaços. Então reli calmamente aquelas folhas, recordando minha juventude, minhas peripécias, meus amores, frases nunca ditas que só aquele diário conhecia. Minha vida estava ali descrita naquelas páginas amarelas.

    Um ruído me tirou a concentração! Era apenas o passado que se desenhava naquele sótão movido pelo som da minha voz ao ler aquele diário. Lembranças de um passado feliz.


* Publicado no Livro Antologia de Contos Fantásticos - Volume 16 da Câmara Brasileira de Jovens Escritores - CBJE (http://www.camarabrasileira.com/acol16-003.htm)