- Não valeu à pena, amor.

- Já sei de tudo!

Na linha, uma voz feminina, trêmula, parecia não conseguia dizer mais nada. O coração estava enorme, obstruía e esmagava as cordas vocais, calando-a...

- Já sabe de quê?

O instinto canalha normal a certos homens falara por ele querendo dar-lhe tempo de formular desculpas, enredos para alguma história digna da confiança dela, mas ele sabia a dor que desencadeara...

-Já sabe de quê? Insistiu ele. Pensou em chamá-la de “meu amor”, mas faltou-lhe mentira para isso...

Houve um silêncio curto e profundo, porém dado o instante, o silêncio pareceu longo e barulhento, no mínimo, ensurdecedor.

Céus, como grita e se arrasta o silêncio em momentos assim!

Ela flutuava descrente da dor que sentia, não sabia onde doía mais, toda ela era uma ferida mergulhada em álcool caseiro e tinha a impressão de estar numa realidade onde o amor jamais existira. No intimo, praguejou da amiga fiel que lhe contara minutos antes da festa na noite passada e dos beijos que seu amado derramou numa boca que não foi a dela. Tinha numa mão o telefone e na outra a mão da amiga colada à sua, numa firmeza de quem segura alguém que não se quer ver cair... Se existia algo que ela amava naquele momento, era aquela mão e aqueles olhos que sofriam uma dor a dois.

Amiga fiel até doer...

- Carol, me fala o que está acontecendo. É algo sério ou mais uma das suas crises de ciúmes sem razão?

Coitado dele: sentia uma culpa esmagadora dessas que faz o homem perder o rumo. Era um imbecil imaturo, fraco no amor, traíra todas as namoradas e tinha orgulho de tal proeza na rodinha de amigos, mas em alguns momentos, nesses que o homem se desfaz da sua mediocridade crônica, sentia que era bem menor que todas as mulheres de sua vida e por isso, covardemente, traía.

- Ricardo, eu sei de tudo sobre a festa. Você me... – as lágrimas interromperam as palavras, impossível tê-las ao mesmo tempo, mas ele havia entendido...

- Carol, aquilo foi... Me desculpa! Clamou.

- Espero que tenha valido a pena – Estranho, mas, ela sentiu que era sincera e que, agora, tinha pena dele.

- Não diga isso! Suplicou-lhe o infiel.

As palavras dela fizeram com que ele procurasse nas lembranças o rosto feminino da noite passada, mas lembrou-se apenas de um canto escuro e da música alta.

- Isso nunca mais vai acontecer! Disse ele com um ar de quem vai morrer. Ainda tinha esperança de salvar os noves meses que estivera junto dela.

- eu sei... Adeus – disse ela desligando o telefone.

Acabou-se o amor nela.

Ele ainda com o telefone junto da orelha vacilou e quase chorou. Quase.

“Tum... Tum... Tum” gemia o telefone solitário junto à orelha.

Um coração culpado e sozinho na linha, ainda sussurrara:

- Não valeu à pena, amor.

Tum... Tum... Tum...