MAIS UMA VEZ

- Sonhei com você a noite passada. – a voz veio rouca pelo telefone.

- Mesmo? – ele arqueou a sobrancelha – E como foi o sonho?

- Úmido. – pronunciou lentamente.

Susteve a respiração. Como sentia a falta dela! A boca ficou seca, hesitou, receando romper o encanto. Após uma pausa, ela suspirou:

- Quero você.

Era o eco do que ele sentia, mas ficou surpreso que ela o dissesse. Tinham se amado muito, apaixonadamente. Pareciam perfeitos juntos. Mas nem só de amor vive o amor – assim descobriram. Embora ainda se quisessem tanto que doía, separaram-se depois de diversos desencontros. Sofreram sozinhos por alguns meses, e acabaram retomando o contato. Falavam-se sempre ao telefone, sobre quase tudo e quase nada. Incidentes, sucessos, dúvidas, mágoas. Só não davam voz àquilo que ainda fazia acelerar a pulsação de ambos, ao mero som de uma palavra banal como “alô”.

Combinaram o encontro às dez, num lugar público. Ele encostou o carro, ela entrou apressada. Cada ato era recheado com sabor clandestino. Encararam-se por alguns segundos eternos. Expectantes, a respiração irregular. Estavam ali de novo, depois de tanto tempo. Não sabiam bem o que faziam, mas sabiam que era impossível não fazer. O carro moveu-se lentamente pelo trânsito movimentado, enquanto conversavam sobre qualquer coisa desimportante. Não se dirigiam a nenhum lugar específico, tanto era o prazer de apenas estarem juntos. Não era racional, não fazia sentido, existia um milhão de motivos para que seguissem rumos distintos. Mas amor é teimoso e não morre tão fácil, por mais que se queira, por mais que o mate todos os dias.

Riam de alguma bobagem quando passaram em frente a uma profusão de horríveis luzes verdes, onde estava escrito “Motel Selva”.

- Vamos? – propôs, maliciosa.

Entre risadas, ele concordou. Por mais grotesco que fosse, aquela noite era mesmo uma grande travessura e detalhes assim só poderiam torná-la mais excitante.

Pegaram a chave na portaria – aonde escolheram o “Leopardo” entre outros felinos disponíveis – e seguiram para a suíte. Acesas as luzes, o ambiente era inusitado. Paredes pintadas de lilás com algumas manchas, pretendendo decoração temática, a cama com imensa cabeceira ornamentada com cetim azul berrante, espelhos no teto e em toda parte, luzes alaranjadas e um sortimento incrível de acessórios eróticos sobre uma mesa. Deliciados, concordaram que o ambiente era perfeito. Não queriam um ninho de amor, quanto mais vulgar, melhor.

Serviram-se no frigobar – duas cervejas – e brindaram. Não havia pressa. Ele tirou do bolso uma caixinha, ela fitou-o, curiosa. Eram dados, daqueles que dizem o que fazer. Beijar-lamber-morder-massagear-beliscar-interrogação. Boca-barriga-pés-nuca-orelha-interrogação. Era um desafio, doce agonia, a cama serviria como mesa. Jogaram uma, duas, três vezes. Mordida na nuca. Beijo na orelha. Lambida no peito. Na quarta – beijo na boca – não puderam mais e agarraram-se, sôfregos, mal conseguindo livrar-se das roupas. Gozaram como loucos, ruidosamente, mal ele a penetrou. Caíram de lado, arquejando, trocaram um olhar dolorido. Como tinham podido se separar, se era tudo tão certo? Como se separariam de novo, depois daquela noite? Procuravam a resposta à pergunta mútua um nos olhos do outro e então perceberam. Não se separariam. Era um recomeço, uma nova chance. Com as emoções afloradas, mergulharam um no outro, mais uma vez. A noite seria longa. Infindável.

Livia Santana
Enviado por Livia Santana em 01/03/2006
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