MEMÓRIAS DE UM ADOLESCENTE EM CRISE [cap.2]

MEMÓRIAS DE UM ADOLESCENTE EM CRISE

CAPITULO 2 - AQUELA MENINA

Eu tinha acabado de sair de mais uma sessão frustrante daqueles filmes de História que duram horas e horas, mas o John como sempre ficara empolgado com tudo isso:

- Demais aquele filme, não?

Eu não conseguia responder a pergunta dele, pois ainda estava me recuperando do cochilo que havia dado na aula.

- Hã? Repete a pergunta John!

- Eu disse, Kim, que o filme foi demais, empolgante, aquelas guerras, explosões e “cabrum!”.

Eu odiava História, odiava Segunda Guerra Mundial, explosões e “cabrum!”. O pior é que quando você odeia aquela matéria, é esta, justamente esta, e somente esta que tem as piores provas, os mais longos trabalhos e os mais chatos e entediantes filmes como o de hoje.

Mas minha mente não estava preocupada com nada disso, ela estava focada em algo mais divertido, algo mais interessante. E este “algo” tinha nome:

Samantha.

A garota que acabara de passar por mim naquele exato momento, pela primeira vez.

Ela era linda, seus cabelos negros realçavam sua cor branca. Tinha um sorriso perfeito.

E lá estava eu, no corredor da escola como um bobo, quase babando.

- Uau, ela é perfeita! Você viu, Kim?

Não conseguia responder novamente a pergunta de John, somente acenei positivamente com a cabeça.

Antes de chegar na porta de casa – depois de mais um dia de aula – podia ouvir gritos que vinha de lá dentro de casa, gritos histéricos que aumentavam cada vez mais.

- MATA ELE, PAUL, MATA ESTE RATO!

Era mamãe dando ordens, ou quem sabe suplicando ao meu pai, em cima de uma cadeira, no meio da cozinha.

Papai corria de um lado para o outro com uma vassoura. Já havia destruído metade da cozinha, creio eu.

- OH ME DEUS! CUIDADO KIM, RATOS SÃO ASSASSINOS!

Eu não tinha medo de ratos, e não o achavam nenhum pouco assassinos, mas mamãe não achava a mesma coisa. Me puxou pelo braço e começou a me usar de escudo.

- Mãe, é só um rato!

- É muito mais que isso meu filho! Ratos são nojentos, transmissores de doenças.

- Mas é só um rato.

- Não podemos ter clemência. Começa assim: damos liberdade para um, e ele traz a ninhada toda.

No mesmo minuto ouvimos um estrondo feito por papai que já estava na sala, um berro dele veio em seguida:

- MATEI QUERIDA! MATEI

Papai veio em direção à mamãe, carregando o roedor pelo rabo, minha mãe a esta altura já estava tapando os olhos com as duas mãos.

- Eis o meliante – sorria papai.

- TIRA ELE DAQUI, PAUL. – mamãe berrava.

Presenciando aquela cena eu só conseguia rir, não agüentava, saí da cozinha deixando os dois lá com cara de “sem entender nada”.

Fui para meu quarto.

Na mesma hora me joguei na cama e comecei a pensar nela.Ela não saia da minha cabeça.

Logo a porta bateu, deixei que entrassem. Não devia.

- Ah não, John, jogar batalha naval de novo?

- Vamos, Kim! Aposto que desta vez não irá me vencer.

John sabia como me convencer. Aquele seu sorriso e olhar de clemência, e a forma empolgante em que segurava a caixinha do jogo.

- Está bem, mas só desta vez. Não tem graça, todos os jogos eu venço!

- Desta vez não, Kim. Tenho uma estratégia nova para ganhar.

Era a mesma frase sempre, eu já havia decorado. John falava que tinha uma nova estratégia, mas não era verdade, eram sempre as mesmas: Navios maiores na ponta esquerda em cima, os pequenos ficavam lá em baixo... Era sempre assim. E mais uma vez eu venci.

- Saiba que eu deixei você vencer Kim? Eu tive pena de você!

- Ora, John, não me venha com discurso de mal perdedor.

- Mais eu digo a verdade, eu deixei você vencer, tinha a estratégia da vitória toda aqui, em minha mente.

Ficamos em silêncio por alguns segundos.

Enquanto John arrumava o jogo em sua pequena caixinha, fez-me uma pergunta:

- Ela mexeu com você, não foi?

- Ela quem, John?

- Ora, Kim, não se faça de besta, estou falando daquela menina hoje na escola.

- Por que você acha que ela mexeu comigo?

- Porque você está esquisito desde àquela hora. Fala pouco e tem um olhar longe.

John falava comigo como se fosse um especialista em mulheres bonitas e garotos apaixonados, coisa que não era.

- Não tem sentido o que você esta falando John!

- Claro que tem Kim, não tente disfarçar!

- Cala a boca John! Vou pedir para a sua mãe mudar de cereais, os novos lhe fizeram mal, afetaram sua cabeça.

John não insistiu, saiba que não iria conseguir arrancar nada de mim naquela hora, tinha certeza, afinal éramos amigos desde pequenos. Foi então que resolveu ir embora, com sua caixinha de batalha naval, foi embora e me deixou com sua pergunta martelando em minha mente: “Mas será mesmo que fiquei mexido com aquela menina?”

Samuel Ramos
Enviado por Samuel Ramos em 04/10/2008
Reeditado em 04/10/2008
Código do texto: T1210671
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.