O homem do armário

Havia já uns dias desde a primeira vez. Mas agora, tinha algo de vívido na imagem. E o homem do armário resfolegou-se em seu canto.

A cama era ligeiramente distante do armário, estava de frente à ele e de lá ela o imaginava se debatendo para sair. O homem do armário não gostava muito da situação, mas não tinha opção, estava preso na teia do destino.

Ela sentou-se na cama desta vez, com as luzes ainda apagadas, viu apenas o tremeluzir do reflexo das luzes da varanda nas portas do armário. E desejou abri-lo.

Pensou em olhar na face do homem do armário e dizer que o amava e que iria tirá-lo de lá, que iria amá-lo por toda sua vida e fazê-lo feliz...

Mas ela teve medo, porque sabia que o homem relutaria em sair do armário.. O homem tinha desejos, mas também tinha medo. E tinha responsabilidades com o armário! Era o que dizia sempre...

O homem tinha uma vastidão de roupas para administrar, de sapatos para manter organizados e de pequenos objetos para manter guardados em seus lugares. Ele tinha sonhos, lindos sonhos em que saia do armário e seria feliz ao lado da mulher de fora do armário. A mulher do quarto.

Mas afinal, ele era um homem do armário e havia escolhido seu futuro quando ainda era jovem. E tinha que manter seus compromissos assumidos, ainda que isso o deixasse distante da sonhada felicidade.

E a mulher no quarto sabia disso, mas o amava tanto! Nunca o tinha visto pessoalmente, porque o homem do armário não se mostrava facilmente, tinha a discrição necessária à sua função.

Bem, foi nesta noite em que a mulher tomou uns cálices de vinho a mais do que deveria, e ligou o aparelho de som com uma música romântica, e se vestiu com a melhor roupa (bem sexy), e se dirigiu à porta do armário. Sabia que ele estaria por ali àquela hora, cuidando de suas coisas... Então ela tocou a maçaneta e deixou que a blusa caísse pelo ombro direito, chacoalhou os cabelos para solta-los bem.

Abriu a porta do armário. Esperou. Chamou pelo homem.

Nada.

O homem do armário sentiu o que estava por vir, ele não era bobo, sabia que aquela mulher queria balançar seu mundo. Então se escondeu por entre pijamas que não eram mais usados. E respirou silente o resto da noite. Mas seu coração não estava calmo. Estava muito acelerado.

E o homem sentiu-se o mais infeliz dos homens...

A mulher, por outro lado, lançou um ultimo olhar de desejo e em seguida de desconfiança, para dentro do armário. Não mais o chamou.

Fechou o armário. E chorou no travesseiro.

A mulher jurou e jurou que nunca mais procuraria o homem do armário, que teria alguém que a merecesse...

O homem ficou dias quieto, pensando em como havia escapado por pouco, mas ao mesmo tempo algo o consumia... E por fim descobriu que a mulher do quarto era a sua única chance de sair do armário.

Então numa noite de segunda feira ele a chamou. Pediu desculpas, implorou perdão e disse coisas bonitas que ela gostava de ouvir.

A mulher chorou. Lágrimas dolorosas rasgaram seu alvo rosto, e ela por fim cedeu. E disse que o amava tanto! Disse que o esperaria...

O homem ficou feliz novamente. Não iria sair do armário, mas caso um dia quisesse teria a mulher do quarto para acolhê-lo.

A mulher também ficou feliz, sentiu-se amada e continuou sonhando com o dia em que ambos compartilhariam uma mesma cama. E não olhou para nenhum outro homem das ruas ou do trabalho ou da faculdade. Apenas viveu o resto de suas noites olhando para o armário marrom...

Alessandra Vasconcelos
Enviado por Alessandra Vasconcelos em 10/10/2008
Reeditado em 02/12/2008
Código do texto: T1221763