UMA PROVA DE AMOR

Era inverno, o ano 1961, nascia no sul,
uma criança do sexo feminino,
muito frágil, pois viera fora do tempo,
não completara os nove meses de gestação,
pra ser mais precisa 6 meses e meio.
Era rodeada por médicos e enfermeiras,
porque sua saúde inspirava muitos cuidados,
tinha fios por todos os lados,
era uma ratinha, mas encantadora,
dona de gestos delicados
intercalados por sobressaltos
toda vez que era momento de trocar o soro,
receber sangue, alimentação ou colocar
uma nova medicação que entrava pela sua
cabecinha tão pequenina e redondinha
que mal podia ser vista de tantas agulhinhas
que naquele instante eram importantes
para que ela sobrevivesse.
Todos os parentes mais próximos e amigos
diziam a toda hora com muita dor:
essa menina não vai se salvar,
mas ela superou as expectativas e foi para casa.
Sua fragilidade era tamanha que não podia sequer
mudar de ambiente pra não adoecer.
Seu banho era um acontecimento diário,
pois o quarto deveria manter-se escurinho,
aquecido e a água com a temperatura esperta,
pouco mais quente do que nornal.
Aquele ritual tinha espectadores,
seus irmãos, o pai, no mais absoluto silêncio
compartilhavam todo o amor e a dedicação
que sua mãe com um algodão embebido
naquela tigela acariciava-a.
Ao mesmo tempo que a deixava cada vez mais cheirosa.
Depois de tudo, um lacinho rosa ou
da cor que combinasse com o que iria vestir
era colado com araldite ou sabonete.
Logo aquele bebê guerreiro tornou-se
uma linda menininha dona de uns olhos muito azuis,
duas bolitinhas cheias de energia e vivacidade
que encantava a todos por onde passava.
Suas irmãs tinham muito ciúme, mas não dela
e sim de quem queria aproximar-se dela.
Aos dois anos aproximadamente,
era tão terrível que subia parede lisa,
não havia obstáculos que a impedissem chegar
onde quisesse, por isso recebia vários apelidos
como: azougue o mais comum entre a familia toda.
A menininha terrível cresceu dando lugar
a uma linda menina apaixonada pela música
e pelo desenho o que aliás dominava como gente grande
as duas artes, só um porém atrapalhava-a,
a sua timidez em demonstrar seu talento em público,
mesmo que fosse somente entre os seus.
Em festas de aniversário ou em outras,
tinham o costume da famosa Hora de Arte,
onde cada qual demonstrava seu talento.
Normalmente ficavam entre o teatro e o canto.
Quando chegava sua vez de cantar era preciso
que apagassem as luzes, virar-se para a parede
e um copo de água na mão, mas não era garantia
que faria seu show, pois nem sempre conseguia
exibir sua linda voz que alcançava tons tão altos
e com tamanha precisão a ponto de ser confundida
com a voz do Michael Jackson, no auge da sua carreira
interpretando Ben.
Na gravação que fez num gravador sonny,
último tipo da época. Não era corujisse de familia,
sua voz era e é até hoje muito linda,
canta afinado, suave, talentosa mesmo, mas não a explora.
Aos quatorze anos era a bola da vez,
a bolachinha recheada do pacote,
tamanha sua beleza e graça, totalmente natural.
Tinha uma enorme roda de amigos e amigas,
primos e primas e o sobrinho,
inseparáveis até quando estavam na praia.
Era namoradeira, mas um amor de cada vez,
apesar de muito assediada,
tinha fila de espera entre os gatinhos da hora
que encantavam-se com sua lindeza
e principalmente o seu senso de humor
que a diferenciava das demais,
sem sombra de dúvida, muito divertida.
Ah! também mimada por todos,
talvez por ser a caçula de uma familia
com grande diferença de idade
entre cada um dos cinco irmãos.
Aos dezesseis anos encontrou o amor da sua vida
que veio de mala e cuia, como se fala no sul
quando alguém muda de um lugar para o outro.
Este homem 11 anos mais velho
a viu num jogo de futebol de salão,
era craque da seleção brasileira,
o famoso camisa 8 do Palmeiras,
que desputava um mundial em Porto Alegre,
apaixonou-se, foi amor à primeira vista.
A olhou da quadra e disse a um amigo
que era parente dela: com esta menina eu caso.
E assim aconteceu quando ela completou dezoito anos,
um casamento de princesa no hotel mais bacana
e cheio de estrelas da época, um luxo.
Agora uma menina com a responsabilidade de um lar
e por longos anos foi exclusiva desse homem,
dedicando-se com todo o amor.
Desse casamento feliz nasceram dois filhos
gerados e desejados com toda força do seu ser..
Caminhou por 25 anos lado-a-lado,
o apoiando nas decisões de negócios ou de lazer,
feliz e completa. Lógico que nada é perfeito,
havia momentos de crise e quando aconteciam
ela segurava-os calada no seu canto
e não aparecia por um bom tempo na casa da mãe,
que notava e dizia: a...deve estar com algum problema,
estou sentindo isso e ela desapareceu.
Com ela a casa estava sempre cheia,
cheia de alegria, tomava a palavra e aos borbotões
contava as coisas, normalmente lembranças
da infância e juventude, coisas pitorescas
que aconteciam como: o carro carregado,
todos sentados e rumo à praia, todos cantando,
quando de repente seu pai perguntou a sua mãe
se ela havia pegado a chave do apartamento
ao que ela respondeu que não.
Ele retornou no primeiro desvio e com o mesmo humor
buscou a chave, deram risadas e praia de novo.
Outra ocasião ficou de castigo porque atirou bexiguinhas
nos transeuntes, na calçada.
Passou a tarde inteirinha imitando os ambulantes
que vendiam frutas, sonho, jornal e gritava;
olha a banana e o mamão maduriiiiiiinhÔ,
aaaaaaa fooooooolha e o pai e mãe
deixaram-na assim até à noite quando ela parou e dormiu.
Tudo isso era motivo de risadas e de elogiar os pais,
pois homem e mulher igual não tinha, até comentavam,
se fosse eu que esquecesse a chave teria
terminado a praia abaixo de bate boca e mais risos.
Um dia esse sorriso fugiu do seu rosto,
seu corpo perdeu a forma, a sua voz calou
e seus olhos perderam o brilho e fixaram-se no nada,
era a depressão que tomava conta
sem pedir licença nem mandar recado,
cada dia mais triste e afastada,
de dar inveja ao final de Camille Claudel,
tamanha entrega ao nada.
Um dia conheceu o Recanto e começou a escrever
e escrever, a única forma que encontrou
de não perder o contato com o mundo.
No inicio imaginava situações bacanas
e irreverentes para colocar em prosa e verso,
mas depois cansada e vencida pela solidão
colocou pitadas de verdade em seus textos.
Apareceu outra habilidade não conhecida,
a comunicação em verso.
Teria inúmeras coisas para contar,
mas uma parte dessa história já é suficiente
para entenderes que vieste para vencer,
és uma guerreira e as tuas armas
são a tua inteligência e a tua resistência.
Já nasceste com tudo isso,
busca dentro de ti em cada cantinho do teu ser,
da tua alma e sentirás todas as vezes
que te safastes do perigo, ficarás mais forte,
porque esta força vem de Deus
e tu és imagem e semelhança Dele.
A tua familia está aqui esperando rir de novo
e se encantar com o teu encanto.
Todo o meu amor, tua irmã, companheira, amiga,
professora e aprendiz, Naiara.
Naiara Barbedo
Enviado por Naiara Barbedo em 22/01/2009
Reeditado em 23/01/2009
Código do texto: T1398275
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