O menino curioso

Era um menino curioso, do tipo que não podia ver algo novo e desconhecido, ou ouvir palavra que lhe soasse engraçada ou difícil, que logo perguntava o que era, do que se tratava, da onde surgira, e tantas outras interrogações que lhe brotavam à boca.

Tinha a mente afiada, como dissera uma vez sua bisa, as palavras saltavam de sua boca mais rápido do que seus pais podiam contê-las. Não chegava a ser chato, mas vez por outra deixava os adultos embananados com alguma questão.

Uma vez perguntou ao tio, um rapazola de seus vinte e poucos anos, o que ele fazia com a namorada quando saiam. O tio ruborizou, titubeou na resposta e finalmente falou:_ “É complicado”. O menino insatisfeito argumentou: _ “Nunca pensei que beijar fosse complicado”!

Vivia assim, investigando, sondando, descobrindo os segredos do mundo, um mundo de mistérios e encantos. E o mais bacana, é que ele tinha o mapa do tesouro, as perguntas.

A cada ponto de interrogação uma cortina se descerrava e uma nova peça se encenava para os olhares extasiados do menino.

O que é telescópio? Para que serve o coador? Quem descobriu o Brasil foram os índios ou Cabral? Como eu nasci?

Até que um dia, uma situação deixou o menino muito triste, sua tagarelice emudeceu, seu mar de perguntas secou, seus olhos perderam o brilho e o mistério tornou seu coração de criança pesado como de um adulto. Seu avô adoeceu e foi para o hospital.

O menino adorava seu avô. O seu primeiro carrinho de rolimã foi ele quem deu. Nas férias, iam junto para o sítio do velho, colhiam laranjas do pé e pescavam no ribeirão. O avô contava as traquinagens do filho, o pai do menino, dizendo que os dois se pareciam por demais.

Não conseguia entender porque o avô estava no hospital.

Dois dias depois, à noite, o pai veio conversar com o menino e explicar-lhe que o avô havia morrido. O menino foi para um canto e, sozinho, fez uma oração. Por fim, sorriu. O pai, sem entender, aproximou-se do menino e disse: _ “Menino, você sabe o que é morrer”? _ “Sei meu pai, vovô me contou. Uma vez, quando eu lhe perguntei o que era morrer, ele me disse que morrer é quando fechamos os olhos e não mais os abrimos, e que depois de um tempo acordamos num outro mundo, com mais mistérios e segredos do que este que estamos”. Parou de falar um pouco, os olhos brilhavam como nunca. Voltou a contar ao pai o que havia entendido da explicação do avô. _ “Agora eu sei porque o vovô adoeceu. Foi para fechar os olhos e ir para este mundo novo, cheio de coisas para se conhecer. Este aqui ele já conhecia de cor e salteado. Estou feliz pelo vovô agora”.

Os olhos marejados do pai demonstravam não tristeza, mas orgulho pelo filho ter respondido, com a singeleza própria das crianças e dos velhos mais sabidos, o maior de todos os nossos mistérios. Era realmente um menino curioso.

CEVDM

Gostou? De uma lida meu outro conto "O andarilho".