Controle

Quando se tem um cigarro na boca, fica mais fácil ter posse do tempo. São alguns minutos sem parecer que é um idiota.

Drogar-se ou não, eis a questão.

Logo eu, tão ingênuo e convicto.

Meu rosto desfigurado pela velhice precoce. Minha cabeça desregulada psicotropicamente. Meu corpo em busca do câncer.

- Não tem graça. Pode ser à esquerda ou direita, as coisas são diferentes para mim. As pessoas nunca serão o que espero.

Aquele pensamento romântico se confunde entre a recusa e exaltação. Entre meu quadro da vontade e desespero.

Então eu uso para esquecer. Para fingir que algum dia um nunca estive lá. Que nunca passei por isso.

Como se a vida precisasse de minha atenção, mas eu viro a cara.

São poucos contatos e muita gente para por em ordem.

- Pode terminar seu show egocêntrico.

Com o tempo as expectativas diminuem. A vida se torna chata. Ninguém mais procura saber de você.

Do centro à margem, esse é o processo da vida.

A saudade se transforma em ódio, não quero botar um fim, mas quero a frase: “Não venha procurar por mim”.

Estou um pouco cansado de suportar mentiras e culpas. Cansei do cinismo infantil. Cansei da mentira de prometer que ia fazer alguém feliz.

Sem drama se o plano não deu certo.

As pessoas deveriam suportar melhor as decepções da vida.

Desculpa, perdi o controle.

O telefone toca e é como se nada importasse.

Quando se atende com a cabeça flutuando por uma overdose de haxixe da noite passada, pode-se esperar tudo de uma ligação.

Era só para me humilhar. Dizer algo que me faça mal. Era só para me ouvir mandar todo mundo ir se foder.

Desculpa novamente por não estar no controle.

Com o tempo a tendência se torna decisão, a vida prossegue esgotando a paciência.

Logo você pára de se interessar por Malcom X, Luther King e Muhammad Ali para se interessar por Albert Fish:

“O fogo toma posse do seu corpo, infiltra-se em seu sangue e quando você se dá conta, é puro fogo.”

Meu sentido da vida anda ao contrário. Eu deveria ser mais responsável, mais bondoso, mais compreensivo. Não há motivo para se interessar.

Perda da noção do espaço e tempo, dores de cabeça por abstinência de algo, cansaço excessivo provocado pelos comprimidos de benzodiapenicos, vomitos provocados pela gastrite que avança a passos rápidos. Um dia você acorda e percebe que tem sangue na boca, uma dinamite no cérebro e 100kg sobre o corpo.

E a porra do telefone para de dar as últimas notícias. As últimas palavras.

Acho que reagi mal aos meus problemas. Não deveria ter quebrado o nariz do cara. Não deveria ter chutado e cuspido em ninguém. Não deveria ter xingado tantas pessoas. E não deveria ter revisado meu pensamento sobre violência domêstica.

Não faz parte do meu processo de fuga.

Não faz parte do meu programa de não encarar a realidade.

As coisas se tornam distorcidas quando se quer reinventar algo.

- Não, obrigado, não quero revisar e organizar meus problemas para resolve-los. Não quero me reerguer de algo. Não quero retomar algo bom. Não pretendo recomeçar nada. Não é minha intenção recuperação.

Quando criança, vende-se o Slogan:

“Antes que seja tarde demais, viva a vida com quem você sempre sonhou. Vagas muito limitadas.”

Desculpa...

“Conviva com pessoas que pensam como você.”

Desculpa...

“Tenha um lar, uma esposa e 2 filhos”.

Desculpa... perdi o controle.

É a sensação de perder algo e agora estar desajustado.

Seu pai sonha por isso. Sua mãe reza todo dia por isso. Seus parentes esperam por isso.

- Sim, está tudo sob controle.

Tudo está indo muito bem.

Não é estresse, é desenquilíbrio. Não é ofensa, é insensatez. Não é nervosismo, é culpa.

Nada pessoal, apenas vingantivo.

O que falta na vida é um intermediário, um “revisador”, um avaliador da situação, alguém que diga que eu estou certo.

Falta alguém que diga que não sou eu, é o outro.

E que tivesse publicidade.

Alguém que diga por mim que não estou no controle.

Plínio Platus
Enviado por Plínio Platus em 07/11/2009
Reeditado em 07/11/2009
Código do texto: T1909509