A mensagem dos ventos

-Eu te amo, Cecília!

A comoção que tais palavras causaram na moça foi indescritível.

Então Vinícius a amava?

Não era a primeira vez que ouvia isso pois em sonhos ébrios,em noites de calor na fazenda ela o via faze-lo das formas mais épicas, românticas, piegas, pitorescas e impossíveis que sua mente pudesse fantasiar.

Mas afinal lá estava Vinícius, um Vinícius real lhe confessando amor. A própria Cecília se impressionaria algum tempo depois de tudo que passou pela sua cabeça do momento da surpreendente, embora esperada, declaração até o momento em que ela exclamou “Minha nossa!” e sorriu enviesado. Quantas perguntas, de anos de convivência, anos de amor platônico. Ama-me há quanto tempo? Desde semana passada, desde o instante em que me viu ou desde o instante em que o vi? E se for uma das duas alternativas finais, por que o disse agora?Por constrangimento, por orgulho, por medo do desprezo? Ou será que não se deu conta de quanto me amava até que um dia chegou cansado de um dia ardo de trabalho, olhou para o lado e, ei, realmente havia alguém ali e, tirando esse nariz arrebitado ela até que não é feia, não! Ou será que foi no Natal quando eu botei aquele vestido azul bonito que papai me dera enquanto servia bandejas repletas de docinhos e salgadinhos preparados com esmero pela Dona Ana, mãe de Vinícius (sua sogra?) que as pessoas comiam enquanto festejavam e gargalhavam, afinal era o aniversário de Cristo.

Vinícius fitou a amada agora sabida que era amada, mas nem um pouco conhecida do quanto. Nenhuma das perguntas de Cecília ameaçaram sair de sua mente e um silêncio aterrador cobriu o quartinho da jovem. Nem o gato miava,nenhum pingo caía como se assistissem já sufocados de curiosidade o desenrolar daquela cena. Os ventos do campo, já há muito sabedores daquele amor subentendido sopraram gelado no ouvido do rapaz, e a Vinícius o vento parecia dizer “fale alguma coisa, seu idiota!”.

O silêncio foi quebrado. Seu Antônio, pai de Cecília (seu sogro?) tinha ligado a recém-chegada televisão e estava no volume máximo que era para despertar inveja nos matutos, que era como Seu Antônio se referia agora a vizinhança. Era pequenininha, segunda mão a bichinha e só tinha duas opções de cores, não era que nem as televisões de tela de cinema que Cecília vira na sua temporada na cidade. “Tem nada não, pai”, sorrira amarelo quando viu o presente de aniversário, pois quando o pai falou “televisão” com aquela boca cheia de dentes, seu coraçãozinho pueril se enchera de esperança.

Vinícius sorriu alto como se ainda tivessem nove anos e estivessem na goiabeira do quintal sorrindo de alguma anedota que ele aprendera na cidade. Talvez imaginasse que, achando Cecília que tudo não passara de mais uma piada, tudo ficaria bem, como tudo ficou bem tantas vezes antes. A amada se acharia não amada e daquele constrangimento estaria livre. Já estava aberta a boca de Vinícius em sinal de explicar a piada, mas foi calada pela própria boca de Cecília e Vinícius entendeu o que os ventos diziam, pois se afastando do rapaz Cecília falou “eu também te amo” e sorriu como naquele dia em que ela estava servindo empadinha para o tio Bernardo, no dia em que ele olhou para ela e se deu conta de como a amava.

Sofia Garden
Enviado por Sofia Garden em 24/09/2006
Reeditado em 24/09/2006
Código do texto: T248190