JURO

Dedicado à menina travessa do Recanto: Eiana Schueler. Amo-vos. A ti e a tuas palavras.

Juro. Juro. De pé junto. Não perguntei nada. Não inventei sonhos ou sofrimentos, mas ela teve mais uma vez esta coragem despretensiosa de me mandar calar a boca como quem pede pra não surrar-me com o som da própria voz. Ela me oferece ombro, peito, abraço, apesar de saber que eu sou avesso a estes subornos que, de tão pequenininhos, eu mal sinto. Digo que quero, digo que sinto, digo que é verdade, enquanto ela se enrosca em seus lençóis e me ama menos, não por eu ser pouco, mas porque o sono é um bicho mordedor, ai, e a pele dela se permite vis dentadas.

Agora mesmo, enquanto ela dorme sonhando com outras maneiras de manter-me acordado, eu sonho. Sonho com a possibilidade de que ela me diga é mesmo... Mas eu sei que não. Ela não é um milagre, ela não é uma conhecedora das coisas, ela pouco sabe sobre si mesma, mas o pouco que ela se nega dizendo não sou eu, admito, eu sou. E ela grita seja, permaneça, abuse da possibilidade de existir, querido. Abuso. Mas pouco existo.

Ela não me ama de fato, não sabe me respeitar direito, mas quer amparar-me em seu colo que antes do amor ou do respeito, já me dizia, é teu colo. E nele deito, certo das maneiras dela rir de mim como quem é conhecedora de meus fracassos, enquanto me esconde cruelmente as minhas vitórias sem graça. Magras, sem dentes, mas são minhas, e ela sabe. Sabe. Tenho certeza que ela só me confessará no dia que eu parar de roubar-lhe o merecido descanso. Seus olhos insistem em compreender aquilo que nem eu mesmo faço questão de escrever em pedra... Rabisco em areia, a onda vem e lava minhas confissões antes que elas me comprometam, mas ela leu a espuma que deveria ser apenas sal, mas também sou eu.

E nem preciso dela, que ela vá embora e nem diga me esqueça. Atreve-se a saber mais de mim que eu mesmo. E ri. Ai, como ri. E me diz pra falar, enquanto cochila quieta. Dorme. Finjo que estou acordado, e não funciona. Quanto mais digo bom dia, mais sinto a voz dela cobrindo de véus e de lençóis este sol que nem é luz e muito menos calor, e me despe.

Quem é ela? Minto que sou o bobo alegre que se equilibra na corda bamba que piso aos poucos enquanto os outros dizem, vai cair, vai cair. Mas ela não. Ela não aposta na minha queda mesmo quando me vejo beijando o chão que transforma meus pés em possibilidades que não me agradam.

Ela já cansou de me dizer silêncios. Ela já cansou de me ouvir dizer o que é que eu faço dos sons que produzo na minha necessidade de ouvi-la temendo compreender-me. Ela me quer um bem que nem eu sei. Ela se revira na rede, ressona, arqueja, e me pede pra acreditar mesmo enquanto tenho medo.

Ela é meio bruxa, meio brinca com o próprio ouvido de tuberculoso que escuta coisas que eu jamais diria pra ela...

E não diria mesmo. Se ela não fosse ela.

EMERSON BRAGA
Enviado por EMERSON BRAGA em 23/09/2010
Código do texto: T2514938
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