Gregório

Naquele dia, como sempre, as horas demoraram a passar, mas finalmente chegou o momento de ir embora. Gregório, que trabalhava em uma metalúrgica do grande ABC, sentia-se fatigado, moído, como se tivesse levado uma surra. A caminho do ponto de ônibus seguia pensativo, o olhar distante, totalmente alheio ao que acontecia em seu redor. Nem percebeu quando atravessou a rua no sinal vermelho.

A chuva ainda caía quando chegou em casa, depois de horas de sufoco no ônibus lotado. Ao abrir o portão, foi recebido pela cadela Laica, que lambeu seu rosto numa demonstração de afeto. Para ele não havia dúvidas, absolutamente, de que o cachorro era o melhor amigo do homem.

Adentrando a sala, foi logo retirando do corpo a roupa molhada, a qual substituiu por um roupão azul. Dirigiu-se, então, até a cozinha, de onde retornou com uma garrafa de vinho na mão. Como não achasse um copo limpo – na pia havia uma montanha de louças sujas e não estava nem um pouco disposto a lavá-las – resolveu beber no gargalo mesmo. Ficou, durante alguns minutos, sentado no sofá, imóvel, absorto nas sensações que lhe percorriam o espírito. O álcool já havia subido para a cabeça.

Lembrou-se de um álbum de fotografias que estava guardado num baú e que há muito tempo não via. Demorou um pouco até achá-lo, perdido que estava entre aquele amontoado de objetos antigos. Deitando-o em seu colo e, tomado por um sentimento nostálgico, pôs-se a contemplar, uma a uma, todas aquelas fotos. Quando chegou naquela em que aparecia um jovem robusto, cheio de vida, deteve-se por um instante. Quantos anos se passaram! Como contrastava com a imagem que se via todos os dias através do espelho! Seria ele mesmo? O tempo, esse carrasco cruel e sanguinário, que não poupa a ninguém e a tudo consome, havia deixado sua marca nos sulcos que já começavam a se formar em sua face. Que decadência! Estava ficando velho.

CONTINUA...

Bruno Martins
Enviado por Bruno Martins em 26/11/2010
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