ENCONTRO NAS ESTRELAS.
 
Ela nem se lembra direito como tudo aconteceu para contar a história. Mas se lembra que eram muitas e iam se reunir na Casa do Lago de uma delas, o objetivo bem especificado: uma terapia de grupo. Contrataram uma especialista que veio da capital. E lá foram elas, as amigas, para um final de semana bem diferente.
 

Ela nem mesmo se lembra quais amigas foram. Sabe que algumas estavam lá porque essas estavam sempre presentes e sem elas, ela também não estaria. Entre as casas sofisticadas que beirava o lago, aquela certamente era a mais simples. Ficava no alto e para se aproximar da água, desciam por um caminho de flores antigas. Caminharam pela orla ora em grupos, ora em duplas, construindo pegadas na alma.  Foram dois dias e duas noites mágicas, onde confidências foram trocadas, pés lavados e aromatizados, comidas preparadas com ingredientes improvisados, como a inesquecível compota de peras, e a incrível noite em que não houve nenhuma guerra de travesseiros, mas uma sessão de lembranças cinematográficas, apresentada através da mímica e que provocou tanto riso que mil palhaços não teriam feito melhor.
 
Mas foi na última noite que, para ela, o melhor aconteceu. Os risos ainda ecoavam no pequeno quarto superlotado quando ela deixou todas para trás, os sons e os silêncios e sem dizer nada abriu mansamente a porta e desceu o caminho das flores antigas até a beira do lago. E então, olhou para o céu e olhou para a água e em ambos viu a mesma coisa – infinitas estrelas brilhando de forma que tudo se confundiu em sua mente e ela não sabia qual era o mundo real, qual era o mundo espelhado. De repente ela não sabia se era ela quem olhava as estrelas ou se eram as estrelas que a fitavam. Só sabia que era parte daquilo tudo, da imensa beleza que se duplicava e imaginou que seus próprios olhos eram estrelas também. As lágrimas escorreram de seus olhos sem que houvesse motivo para chorar. E foi nesse instante que sentiu que as estrelas choravam também: nenhuma nuvem no céu ocultando as estrelas, mas a chuva caiu como se fossem lágrimas vindas dos olhos que brilhavam na noite. Foi apenas um minuto, talvez menos que isso, mas foi o suficiente para que sua alma se sentisse limpa e saciada por um longo tempo, como se tivesse se encontrado consigo mesma após muitos anos de separação.



(em Escritos de Março - 2)