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OLHOS DE MAR
                                                                                
                                                                                         
É tão linda a jovem. Cabelos cor de mel, olhos de mar, ora azuis, ora verdes.
Os pescadores suspiram por ela. Ela ignora a todos. Senta-se à beira da lagoa, ajeita a longa saia florida e, cantarolando, descasca camarões. É de pouca conversa e trabalha rápido como ninguém. Depois da tarefa cumprida, sai pela praia a perder de vista. Ninguém sabe onde mora.
 
As mulheres dos pescadores também não tiram os olhos dela, parece uma sereia. Temem por seus maridos, cada vez mais encantados pela menina.
 
As pessoas começam a contar histórias...
Dizem que ela sempre esteve em andanças pelas colônias de pesca da Costa Doce, aparece quando o mar salga a lagoa e abunda o camarão. Contam que os pescadores brigam a faca pela jovem, já houve mortes, desaparecimentos; um homem se enforcou, disseram que foi por ela.
 
Cautelosas e ciumentas, as mulheres reúnem-se certa noite, enquanto os pescadores bêbados dormem. E decidem o destino da moça.
Com o pretexto de visitar comadres em outro pesqueiro, saem cedo e levam com elas a moça, no barco, rumo a São Lourenço. Quando a costa se avista encolhida pela distância, jogam a menina na água.
Olham em torno por algum tempo. Dela, nenhum sinal. Ao fazer o caminho de volta, avistam a saia florida flutuando ao sabor das ondas.
A todos, contam que ela caiu do barco e se afogou.
Os pescadores vasculham as águas por todos os lados. Não encontram o corpo.
Naquela noite, afogam-se em pinga.
 
A tranquilidade volta a reinar na aldeia.
Abril chega quente e calmo, já não há camarões a arrastar. Os homens voltam a pescar longe da costa. Certo dia, alguém traz a notícia que havia muita tainha para os lados de São Lourenço e um dos pescadores pega o barco e vai averiguar.
Não volta.
Três dias depois, encontram o barco muito distante dali.
A consternação passa, outro pescador dirige-se com o melhor barco do pesqueiro ao mesmo local. Também não volta. E nem o barco encontram.
O medo espalha-se rapidamente. Mas, apesar disso, outros aventuram-se em busca das tainhas e igualmente desaparecem.
 
Os pescadores assustados mudam de pesqueiro. As viúvas permanecem na aldeia e, eventualmente, pescam para o sustento. 
Numa tarde quente, distraídas com a pesca abundante, não percebem que o barco se afasta rapidamente da praia. De repente, uma doce melodia.
Ao longe, no mastro do barco perdido, tremula a saia florida...
 

N.A.:
Conto publicado no livro NEM TODAS AS PALAVRAS... 2010, Editora Nova Prova, Porto Alegre/RS.
  

Tânia Alvariz
Enviado por Tânia Alvariz em 03/05/2011
Código do texto: T2947421
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