Rejeitada

Quando nasceu já haviam outros de uma vida igualmente sofrida. Não moravam por muito tempo em lugar algum. Sempre mudando. Sempre fugindo de algo. Era assim a vida de Amanda. Cresceu mendigando no sinal. Morando nas ruas. Debaixo da ponte. No meio do lixo. No meio do nada.

Se tinha familia? Sim e não. Depende do que vc chama de familia. Tinha pais e irmãos. Mas não havia amor, cuidado ou alimento. Cada um se virava se quisesse sobreviver. Uma coisa havia, sem falta. Abuso. Vindo do próprio pai. Amanda conheceu o sexo através de seu pai. Na calada da noite, nas ausências da mãe que estava sempre bêbada ou drogada. Não por prazer, mas por ser obrigada, a custo de ameaça e violência. Desde então teve nojo de sexo.

Já maior passou a compreender que mudavam constantemente fugindo da polícia. Os pais os usavam pra algo que não era certo. Certo dia, finalmente o conselho tutelar conseguiu chegar até eles. Seus pais foram presos por uma série de crimes, e também por maus tratos e abuso sexual. Amanda e os outros irmãos foram para um orfanato. Regularmente psicólogos e assistentes sociais vinham conversar com eles. Faziam perguntas do passado. Do que esperavam do futuro. De como estavam se sentindo ali naquele lugar, longe dos pais e da vida que tinham.

O tempo foi passando. Os irmãos menores foram adotados. Amanda com seus irmãos maiores passaram a ser levados de um orfanato a outro, como mercadoria que ninguém queria. Tempos num lugar, tempos noutro e a revolta dentro deles só aumentando.

Amanda era rebelde. Não prestava atenção nas aulas. Não deixava ninguém se aproximar. Fazia questão de ser mal educada. Fazia questão de desobedecer e irritar as pessoas. Fazia questão que notassem seu descontentamento com tudo e todos. Fugia sempre. E sempre a achavam.

No fundo, só ela sabia o motivo de tudo isso. Tinha consigo uma tristeza muito grande. Não entendia porque precisava passar por aquilo. Não entendia porque ninguém a levava pra casa. Assim como não entendia porque era devolvida sempre que alguma familia ficava com ela pra experimento por uns dias. Sentia-se rejeitada. Humilhada. O pior dos seres. E nesses dias perguntava-se cada vez mais o motivo de ter nascido.

Jordana Sousa
Enviado por Jordana Sousa em 20/06/2011
Reeditado em 05/07/2011
Código do texto: T3047478