Comedores de cérebro

O frio estava ameno aquela noite, as estrelas estavam bem escondidas atrás do manto escuro que cobria o céu, nem mesmo a lua queria dar as caras naquela noite. A única luz que o permitia enxergar qualquer coisa era a dos postes que iluminavam toda a avenida, vazia por sinal, já havia passado da hora de dormir, não era seguro estar na rua tão tarde, os monstros comedores de cérebro poderiam pegá-lo, mas ele não podia ter medo, isso os atrairia, estava pensando nas possibilidades de fuga daquela avenida deserta, quando, meio de repente, um papel surgiu e bateu contra o rosto dele sem avisar.

Ele tirou o papel do rosto com medo do que veria assim que tivesse os olhos livres, mas quando pode enxergar, mais que palavras difusas, tudo que viu foi o frio da noite que o cercava. Segurou o papel com as duas mãos, pensou em rasgá-lo, pensou em jogá-lo no lixo, pensou em queimá-lo ali mesmo, com o isqueiro que ele levava no bolso, sem utilidade alguma desde que ele passou a fumar o cigarro elétrico, mas não fez nada disso, ele leu, apenas leu, as palavras “você está sendo enganado”, e assim que terminou de ler a frase sentiu algo estranho, algo forte, algo quente, o frio da noite sumiu, simplesmente houve um parar de frio, mas também não senti calor, era apenas isso, um negócio de não sentir nada, a avenida foi tomada por um tanto de gente, pessoas estranhas para ele, diferentes, pessoas sem pressa, pessoas sem medo da noite, a luz dos postes apagou e a rua tomou um tom brando, da lua cheia que iluminava muito mais que o céu, as estrelas que até então estavam mortas, escondidas embaixo do cobertor temendo o bicho papão, o fizeram mergulhar em um monte de pontos e desenhos incríveis, algo que ele só imaginara em sonhos.

Um grupo de pessoas o chamou, havia seis, dois homens e quatro mulheres, vestidos para uma festa hip, ele não teve medo, nem pestanejou, apenas seguiu seus extintos, e foi se juntar ao grupo. Teve uma noite maravilhosa, com festas e brincadeiras, a noite pareceu durar até um pouco mais que de costume, mas acabou, não ouviu uma palavra de ninguém que fosse, apenas risadas e sorrisos, apena no fim alguém se comunicou com ele, por meio de um papel que dizia “cuidado com os agentes brancos”, decorou as palavras e concordou com um aceno. A partir daí, todas as noites ele se demorava mais que de costume e se encontrava com seus amigos, nunca mais houve nenhum tipo de comunicação, além de sorriso e olhares, mas ele era feliz, ele os entendia, e eles a ele.

Uma manhã, após uma noite maravilhosa foi que ele compreendeu aquelas palavras que o homem lhe escreveu, “cuidado com os agentes brancos”, assim que acordou primeiramente ouviu a gritaria, três homens totalmente vestidos de branco invadiram o apartamento e o levaram, esses falavam, e toda hora repetiam, “o chip está queimado, o chip está queimado”, apontando para a mancha negra que havia se formado no braço direito dele desde que lera aquele primeiro aviso, ele foi levado, e aqueles que o advertiam para não ficar até tarde na rua lhe comeram o cérebro.

Amanda França
Enviado por Amanda França em 30/06/2011
Reeditado em 01/07/2011
Código do texto: T3067000
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