Propostas Irrecusáveis

O telefone tocou, ele não se preocupou em atender, não era nem dez horas da manhã ainda e o telefone já havia gritado seis vezes, sempre a mesma história, ela já se sentia cansado, “Senhor João, temos uma proposta irrecusável...” e blábláblá, ele já não suportava mais tanta ousadia, se perguntava em que fim de mundo aquelas pessoas conseguiam o telefone dele, se sentia perturbado, por vezes só queria descansar um pouco, mas o telefone não permitia, e quando não era telefone eram correspondências, folders, outdoors, já haviam ousado até mesmo espalhar “santinhos” pela rua, com o nome dele, implorando para que aceitasse a proposta, e o pior, não era apenas um interlocutor que o atazanava, haviam vários que ligavam em momentos impróprios ou o esperavam em frente de casa, com o que chamavam de “propostas irrecusáveis”, por vezes ele andando como qualquer outro na rua e era interrompido de sua caminhada por vários homens ou mulheres gritando por ele, para que ele desse atenção.

Ele já havia pensado em fazer muitas coisas, mas nada adiantava, já havia procurado as autoridades, ligado para o prefeito, o PROCON, e até mesmo para a mãe dele, que propôs que ele fosse morar com ela, no começo, quando eles ainda não sabiam para onde ele havia ido, as importunações pararam, mas logo que descobriram começaram a atormentá-lo novamente, e a mãe, após algumas semanas com a paz também perturbada pediu para que ele voltasse para o próprio apartamento.

Naquela manhã, como em outros dias, esperou que o telefone tocasse mais cinco vezes, eles geralmente desistiam quando ele não atendia no quinto toque, porém quando não acontecia, como foi o caso, ele saia, para espairecer e pensar na própria existência. Assim que saiu foi abordado, antes que atingisse a calçada, por um pivete, após saltar da árvore que ficava logo na entrada do edifício, gritando como louco, “Seu João, Seu João, por favor, Seu João, o Seu Lucas disse que dobra qualquer que seja a quantidade de dinheiro que está recebendo agora”, ele passou fingindo nem ver, mas ainda antes que pudesse atingir a calçada um homem muito bem afeiçoado, que surgiu de uma barraca pequena apertada entre outras na calçada, gritou, “Esqueça esse moleque, Senhor João, nós triplicaremos qualquer que seja a quantia”, e antes mesmo de ver a mulher ele ouviu a voz, “Bobagens, Senhor João, quadriplicamos”, e logo virou um reboliço na rua, gente surgindo de todos os lados gritando propostas e quantias cada vez mais altas, João se viu aturdido, e não soube como correu como o The Flash de novo para dentro do prédio, onde o Carlos, o porteiro, disse com um sorriso, “As coisas estão boas em Seu João”, João apenas olhou com expressão de poucos amigos, ele não via nada de bom naquilo, desde que houve um grande aumento na construção civil no país, João, um pedreiro comum até então, vivia sendo importunado daquela forma, no começo havia sido maravilhoso, o aumento no salário, outras propostas, por vezes melhores, de emprego, um aumento muito grande nas oportunidades, mas após algum tempo as propostas se tornaram tantas que não havia mais trabalhadores, e então começaram as brigas entre as empresas pelos poucos que ainda restaram, João apesar de já empregado era um alvo certo de todas as empresas, e com aquela bagunça a mulher e os filhos o deixaram, agora ganhava mais do que já pensara que ganharia, e trabalhava apenas poucas horas por semana, mas hoje em dia nada disso importava, tudo que João queria era ir dormir pelo menos um dia se receber ao menos uma proposta de emprego.

Amanda França
Enviado por Amanda França em 03/08/2011
Reeditado em 01/09/2011
Código do texto: T3137084
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