Sobre Intensidade

- Eu quero te dizer uma coisa...

Ela me olhou por três segundo, os piores segundos da minha vida e então desviou os olhos como se já houvesse lido em mim o que eu teria de ferir seus ouvidos dizendo

Esperei que dissesse algo, mas ao contrário do que eu esperava, ela não chorava, não gritava, não replicava, mas ficava ali silenciosa sem me entregar o que pensava.

Eu detestava estar ali, detestava acabar com aquele sonho doce, colocar um fim no nosso final.

Sim, eu acreditava que o amor era eterno, mas sentia que as coisas não corriam mais do jeito que eram pra fluir. Queria fugir e fazer com que ela parasse de sofrer por algo que eu já não poderia oferecer.

Eu não fazia a menor idéia do que estava acontecendo, mas ela parecia controlar toda a situação, como se houvesse ensaiado cada movimento, cada expressão com a maior das minúcias.

- Diga – ela encarou a janela, por onde o mundo passava ao lado de nosso ônibus vazio, vacilei, a voz dela era crueldade, aquilo não fazia parte do contexto, tinha uma nota grave de desespero, como se fosse arrebentar por dentro a qualquer instante, mas seu rosto parecia o mais tranqüilo de todos os anjos. E então ela me lançou um olhar, daqueles que lhe atravessam a alma, típicos dela, ela não era de palavras, quem perde tempo traduzindo as coisas em letras sou eu, ela diz tudo com relance de olhar.

- Não me olhe assim...

Ela voltou a encarar a janela e eu fechei os olhos para não ver o que diria.

- Eu queria dizer que talvez seja melhor a gente terminar – as palavras não saiam de mim, eram só um ensaio de tantos dias atrás, tantas horas escolhendo o jeito certo de feri-la e agora estava feito, como se tivesse vomitado toda a reflexão de minhas horas em claro.

- Você queria ou quer?

Por que me dar tantas rotas para retornar?

- Quero – abaixei os olhos e torci para que aquilo acabasse logo.

- Por quê? - ela me olhava e isso doía.

- Não sei... Às coisas já não são mais tão intensas como antes...

- Tudo bem, não vou tentar te fazer mudar de opinião, quero-te pelo mesmo motivo que começamos, por qualquer outro é bobagem.

Eu a abracei, meu corpo a abraçou, foi ele, não eu, e em seguida estávamos nos beijando, um beijo desesperado, com gosto de fim, mas ainda eram os lábios dela nos meus, era a magia que não sentia a tanto tempo naquela boca, como renascer de repente no fundo de um ônibus. Ela me abraçou de novo, senti seu corpo vibrar em um soluço e então ela sussurrou no meu ouvido:

- Seu ponto é o próximo. Amo você.

Me distanciei, me despedi e desembarquei descruzando tantos caminhos que me uniam ao destino dela.

Thaina Chamelet
Enviado por Thaina Chamelet em 24/12/2011
Reeditado em 04/12/2013
Código do texto: T3404089
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