GENTE DA LAMA

Não são porcos, mas vivem na lama no meio do lixão, disputam com ratos e urubus, para encontrar algo e vender, assim garantir o sustento da sua família.

Ela é uma mulher de quarenta anos de idade, mas tem aparência de muito mais, sua pele já foi branca um dia, agora é quase marrom, esturricada pelo sol e a sujeira do lixão, que por mais que se lave, não sai.

Tem cinco filhos, todos pequenos ainda, o maior tem apenas quinze anos, é o que lhe ajuda a catar coisas no lixo. Os outros ficam dentro de casa a espera da mãe e do irmão mais velho, trazer algo para acalmar a fome, que grita dentro daquelas barrigas enormes, cheias de verme. São crianças infelizes, que não brincam, apenas esperam para comer algo. Não brigam entre si, apenas esperam, dia após dia.

No meio do lixo é preciso ser rápido para catar papelão, latinhas e coisas boas, que os outros jogam fora, são muitos homens fortes a catar também.

Seu barraco e feito de madeira e papelão, tem fogão, geladeira, rádio e até uma TV, tudo funcionando muito bem, graças a um bico de luz que seu Zé puxou pra eles, em um gato muito mal feito. Os aparelhos são ligados em uma extensão que as vezes desliga tudo, se alguém esbarra no fio.

Mãe e filho ficam no lixão de manhã a noite, comem algo, por lá mesmo, sempre se acha frutas, pão velho, e com sorte até iogurte.

A noite, leva o carrinho carregado, que chega cair pelos lados.

Ao chegar em casa, oferece alguma comida as crianças famintas, e recomeça no trabalho, agora é separar, juntar e arrumar no carrinho feito de uma carcaça de geladeira, pela manhã o filho vai vender todo o material. Tem que ser ele, porque é o único que sabe ler e contar o dinheiro, aprendeu com um outro cartador, que sabia ler e escrever.

A noite, depois de um banho de balde e caneca, finalmente seus corpos cansados, vão descansar em um colchão jogado no chão.

As crianças que ficaram sozinhas o dia inteiro, dormem de cansadas, sem beijo, sem histórias e sem jantar, comeram apenas umas bolachas meio mofadas, que a mãe achou no lixo, para beber, tinha um copo de água para cada um.

Na madrugada seguinte, tudo recomeça para a mãe e o filho, que espera conseguir inteirar o dinheiro para comprar o gás, que já acabou há mais de três meses, obrigando que cozinhem na lenha.

Eles não sonham, não pedem, não choram, apenas vivem, dia após dia, com seus corpos, que vão se deteriorando cada vez mais. Ligam a TV e assistem cenas de uma vida vivida em outra dimensão, nem sabem, que a maioria das pessoas vivem com dignidade, estudam, ganham presentes, vão ao médico, passeiam, recebe até ajuda do governo.

Mas eles não são ninguém, não existem para o país, nunca foram registrados, não sabem o que é isso. Olham aquelas propagandas de coisas bonitas não ousam imaginar, que um dia poderão comprar, apenas esperam que as pessoas se cansem e joguem fora.

Essa é a vida da gente que vive na lama eterna, que o chorume deixa no meio do lixo. Eles já não sentem mais o mal cheiro, não sentem dor, não sentem amor. suas almas necrosaram em vida, apenas aguardam a hora da morte.

Glória Cris
Enviado por Glória Cris em 31/12/2011
Reeditado em 31/12/2011
Código do texto: T3414998
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