O PRIMEIRO BEIJO! (EC)

 
 
 
Era um tempo de janeiro. Do janeiro em que o verão era real – dava pra fritar ovo nas poucas avenidas asfaltadas da cidade pequenina e perdida no meio do mapa. Asfaltadas, só as avenidas transversais; as ruas (aquelas que cortavam as avenidas) eram de chão batido, onde a Prefeitura apenas passava com o caminhão de pedregulhos, vez ou outra.
 
Lembro-me ainda daquela inocência que me detinha, do rubor nas faces quando o via parado na esquina de sua casa. E do desejo! Ai, quanto desejo corria em minhas veias por aquele português alto, olhos azuis - e lindo! Chegava a doer. Pensava nele o dia todo e, quando dormia, era a imagem que aparecia em meus sonhos de menina.
 
Domingo à tarde, muito sol, a quentura à flor da pele, monotonia total. Sozinha em casa, não o vi chegar e assustei-me ao ouvir o som de sua voz, pronunciando meu nome. Estava perdida naquela canção que não me saída da cabeça, falando de amor. Não sei por que a escolhi como a “nossa” música. O rádio (AM) a executava, religiosamente, aquele horário, todos os dias. E eu a cantarolava sempre, pra não esquecê-lo.
 
Virei-me, surpresa. Era ele. Só senti suas mãos me enlaçando o corpo, afagando meus cabelos e roubando-me um beijo. Aquele beijo quente com sabor de hortelã, em minha boca. Meu resto pegou fogo, como se ardesse em chamas, literalmente. O corpo todo tremia. (aqueles tremores que hoje a gente sente só quando leva um susto ou sente dor).
 
Nada mais vi. Nada mais eu senti. Fiquei ali, estática, vendo-o afastar-se sem dizer uma única palavra. No dia seguinte, mudou-se com a família para outra cidade, outro estado – o pai, funcionário da usina, fora transferido.
 
Nunca mais o vi. Não tive mais nenhuma notícia de sua família, ou dele. Mas, até hoje, sinto aquele beijo que me emudeceu por algumas horas. Que me fez ficar noites e noites sem dormir, passando a língua nos lábios e engolindo aquele sabor de hortelã. Faz tanto tempo... Mas parece que foi ontem!
 
Ah... A inocência dos meus treze anos de idade, que jamais voltará!
 
 
(Milla Pereira)

 
Este texto faz parte do EC
PARECE QUE FOI ONTEM.
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