Miguel.

Outro dia li no R.L. uma  crônica muito interessante,imediatamente me lembrei do que uma senhora me contara  certa vez  sobre Miguel.
Para que possa ser entendida tenho que começar a contar o que se passou desde o começo.
Seu avô era  muito amigo de um árabe de nome Rafael,que tinha muitos filhos e filhas,A amizade entre eles durou até a morte,e alem dela através dos filhos,eram considerados na cidade como irmãos.As moças eram amigas de sua mãe,mesmo antes de seu pai e sua mãe se conhecerem e namorarem.Um dos filhos de Rafael seguiu a carreira religiosa,chamava-se Miguel,os demais também tinham nome de santos e anjos.
Seu pai, por intermédio deles conheceu sua mãe,se casaram e mudaram para uma cidade distante.Logo sua mãe engravidou,teve uma gestação tranqüila,mas no parto surgiram complicações.O médico da pequena cidade do interior carente de recursos,tentou de todas maneiras facilitar o nascimento da criança,mas nada adiantava.
O médico então pensou em transferir a mãe para um centro maior onde houvesse mais recursos para submetê-la a uma cesariana, mas logo abandonou a idéia, suspeitava que ela não resistisse a viagem.
Durante dois dias foi um sofrimento para ela, além das dores apresentou febre alta. O médico penalizado alertou o marido para um possível fim trágico para mãe e filho,mas deixou uma parteira no quarto da mulher para qualquer eventualidade, e se retirou preocupado.
Ela sempre  contou para a filha, desde quando  era pequena que seu nascimento foi incrível,ela dizia e ainda diz que na madrugada do dia 29, estava quase morta  de cansaço e com muitas dores, viu o anjo Miguel de cor azul forte voando sobre ela, ele então lhe disse que colocasse um travesseiro sob as nádegas que a criança nasceria.Com muito esforço ela obedeceu, dentro de instantes o bebê nasceu,a parteira que dormia ao seu lado não acreditava no que havia acontecido,imediatamente chamou o médico,que entrou rapidamente no quarto e constatou que a mãe estava muito bem e a criança também,era uma menina forte e saudável.
Depois de algum tempo, seus pais retornaram a  cidade de origem para que a família e amigos participassem de seu batizado, celebrado por seu amigo  Frei Miguel, agora pároco  da pequena igreja.
Logo seus pais se mudaram para outro Estado, mas estavam sempre em contato com os amigos-irmãos, a amizade  entre as famílias permaneceu e permanece até hoje,agora entre  seus netos e bisnetos
Seu casamento foi celebrado por Frei Miguel,os padrinhos foram Maria José e Agostinho,irmãos de Frei Miguel.
Depois de casada ela morou em várias cidades. Teve dois filhos,um menino e uma menina.
Moravam no Rio de Janeiro, quando um casal de amigos os convidou para passarem o fim de semana numa cidade chamada Miguel Pereira.
Seu filho mais velho tinha dez anos e amenina oito, foi então que nessa cidade ela concebeu seu terceiro filho.Uma gravidez inesperada!
A criança  foi ansiosamente aguardada pelos irmãos , pelos pais por toda a família e amigos.O parto foi complicado,mas felizmente nasceu um lindo menino loirinho e bastante forte,os irmãos escolheram seu nome, Luiz Renato.(o primeiro nome significa lutador e o segundo re-nascido).
Ela cantava muitas canções de ninar para ele, mas a criança tinha verdadeiro pavor quando ouvia a musica que diz: “nesta rua tem poste que se chama solidão, dentro dele tem um anjo que roubou meu coração”,tanto que quando queria brincar com ele , ameaçava cantar a canção,ele implorava para ela parar, ela achava graça e parava.
Mal sabia  o que a esperava...
Renato, era um rapaz bonito, destemido, gostava de desafiar perigos,um filho muito diferente dos irmãos,tanto fisicamente quanto na personalidade,sempre dizia e de fato agia de acordo com o que afirmava,  “prefiro viver a vida intensamente por dez anos do que viver cem anos na monotonia, no marasmo”.
Responsável fundou uma empresa cujo símbolo era uma espada num fundo azul vibrante com o logotipo da empresa logo abaixo.

Preparava-se para casar, quando aconteceu a tragédia,que o levou para sempre do convívio da família. Ela se absteve de me contar detalhes...
O sofrimento foi imenso, a família desabou num profundo poço de angustia  e tristeza.Os irmãos não se conformavam,sofreram demais.
Algum tempo depois, ela voltou ao cemitério onde ele se encontra sepultado no local existe várias capelas, cada uma tem um nome.
Sentada num banco frente as capelas mortuárias juntamente com seu marido, ficou lembrando de seu filho revivendo os bons momentos passados com ele,e curiosa perguntou:
-Você sabe em qual das capelas o Luiz Renato foi velado?
Ele respondeu:
-Nessa aí que está a nossa frente, a capela de São Miguel Arcanjo.
Ela não podia acreditar no que ouvia, abalada,começou a juntar os acontecimentos,ligar os fatos,datas...
Seu nascimento, batismo, casamento, o nome da cidade onde concebeu o filho, e a capela mortuária, a espada como símbolo da firma...
O nome Miguel estava presente em todas as ocasiões, alegres e tristes,
interessante como as pessoas vão levando a vida sem atentarem para os  acontecimentos, não sabem “ler” os sinais que a vida lhes dá!
Era muita coincidência, mas ela não tinha percebido esses detalhes, assim como não soube pressentir o aviso subliminar que a canção de ninar lhe enviava através de seu filho.
O anjo da canção infantil, na verdade roubou um pedaço de seu coração, mais conformada hoje ela o entende. Ele queria  de volta seu menino, renascido e a seu lado...
Ela suspirou profundamente, um sorriso tímido quis aparecer em seus lábios,mas lágrimas de resignação e saudades desceram pela face sofrida!
 
M.H.P.M.