Ela ja sabia
Ela sabia que era tarde, mais do que deveria, menos talvez do que gostaria. E podia supô-lo pela luz que ao passar pelas persianas de plástico riscavam o quarto do teto à cama. E iluminava os corpos inertes, ou seus pedaços entorpecidos que escapavam do lençol amarelado.
Sabia que já devia estar longe, sabia, aliás, que não devia nem ter estado. E procurava agora nos fragmentos da noite anterior, álibis que pudesse usar para domar as cobranças da consciência própria. Cobranças que não tardaria virariam uma conhecida dor de cabeça e uma náusea azeda.
Conhecia de cor o processo, alguns dias de reclusão (um paliativo tolo para a própria desaprovação), uma cartela de ansiolíticos, e uma secretária eletrônica ligada permanentemente.
Depois viria a fome de ar, e aquela força que a empurrava pra fora de casa, e como uma tonta tateando a cidade escura ia percorrer o caminho que sabia seu.
Até amanhecer na urgência do próximo sol.