O pesadelo - parte II

Ainda não tive tempo o bastante para de fato mudar algumas atitudes. Porém, ainda não havia tamanha necessidade para que fizesse alguma mudança. Estava apelando para o vinho; que grande companheiro ele pode ser nos dias em que estou só. — Estranho seria se eu não estivesse, pois, eu sou um solitário. Que petulância a minha, dizer que estou só. É praticamente um pleonasmo: sempre estou só. Um pensamento me veio à tona: “Nada daquilo que ela me disse pareceu fazer sentido. Algumas respostas nunca nos vêm no devido tempo, esperamos dias para que tudo se ajeite, mas no fim, tudo parece piorar ainda mais.” Eu ainda não havia compreendido sua fala de outrora, mamãe sempre dizia para que eu arrumasse alguma mulher. Ela, porém, não entendia meus sentimentos, talvez nem eu mesmo os entendesse. Será que insanidade havia me atingido? Não, eu não posso estar louco, o que tem me acontecido é que estou usufruindo os pensamentos de outras pessoas e não os meus próprios. Penso que o estado depressivo tem muito mais a ver com a relação nossa com nosso inconsciente. Quando não estamos de acordo com nós mesmo é que surge a angústia para nos maltratar ligeiramente. Eu nunca tive tanto medo de estar só. A solidão é mais do que minha amiga, ela nunca me cobra mais do que estar só. Apenas eu e ela, nos amando; da aurora ao crepúsculo.

Lótus, como era de se esperar, estava impaciente para uma volta na rua. Hoje já se fazia exatamente duas semanas em que não saia. Eu não senti falta, mas tenho que respeitar meu amigo. Troquei de vestes e me coloquei para fora de casa. Mas com alegria por estar com meu amigo solitário. Lótus estava radiante, e como sempre urinou em todo e qualquer local que achou adequado. Ele ia feliz, me puxando, e eu, estava apenas a olhar as pessoas de relance, sempre com a cabeça erguida e apontada para frente. –Não, eu não tenho repugnância para com as pessoas, eu apenas gosto de estar só. Elas não me causam mal algum, não me fazem ter qualquer sentimento por elas, porém. Hoje resolvi não fumar, seria melhor assim, gosto de preservar minha saúde, e não posso colocar em provação a qualidade que minha vinha tendo nos últimos anos.

— Oi, Fred. – Era Elise, uma conhecida.

— Oi, Elise. – Foi o máximo que pude responder, ela era efusiva: pessoas dessa estirpe eu quero manter a maior distância possível.

De volta para casa, depois de um passeio de aproximadamente trinta minutos, Lótus já se sentia satisfeito. A felicidade de um cão é fácil, basta um pouco de carinho e atenção que ficam logo alegres. Nunca estão de mau humor, irritados com qualquer picuinha, diferente das pessoas, que sempre estão desejando algo, irritadíssimas, e querendo matar a todos. “Ainda devo pensar sobre minha solidão, talvez eu possa descobrir alguma intolerância, alguma falta de entendimento, talvez eu mesmo seja o problema do fato.” Esses pensamentos logo me levariam à loucura.

Já estava em casa neste momento, abri logo minha garrafa de vinho, aquela mais barata que poderia adquirir em qualquer distribuidora de bebidas de bairro. – Não me dou o luxo de gastar fortunas com um prazer vicioso. Acho que para o tanto que costumo beber em dias demasiados depressivos, meu dinheiro não duraria por muito tempo.

E lá se vão às horas, já se passavam das dez horas da manhã, e eu estava mais uma vez submerso em meu universo paralelo. Em dados momentos eu pensei na ideia que minha mãe tinha me proposto, mas logo me desfiz dela. – Mamãe só pode estar louca. E não eu. A esta altura de minha vida arrumar uma mulher? Não posso ser louco para cometer tal injúria com minha própria vida. — E a minha solidão, para onde iria? Vou dormir um pouco, que os pesadelos não me surjam novamente.

Guilherme Cesar Meneguci
Enviado por Guilherme Cesar Meneguci em 14/06/2012
Reeditado em 14/06/2012
Código do texto: T3723727