NOITES DE PORTO ALEGRE

Aqueles nossos serões eram momentos mágicos, reuníamo-nos em um pequeno grupo de familiares e amigos , onde as histórias do passado distante eram revolvidas. Cada um tinha o seu causo,as suas passagens que se não nos faziam chorar nos faziam rir e muito. Mas também tinham aquelas de expectativa e suspense. Essas eram as histórias do seu Tavares.

Seu Tavares, Patriarca da familia, aproveitando a sua posição de quase octagenário deleitava-se relatando o que dizia ter sido o seu passado de boemia. Contava que teve a sua mocidade, lá na década de cinquenta, desfilada nas ruas e ladeiras da nossa Porto Alegre. ouvi-lo era como presenciar as suas vivências e andanças a perambular pelos bares e botequins, onde, com certeza , ao som de Lupicinio, alguém curtia as mazelas de um amor desfeito.

Eu, particularmente, me deliciava com as historias contadas, e, curiosa, sempre pedia detalhes dessa vida de boêmio que parecia ser repleta de noites cheias de mistério, rum, cuba-livre e muito, muito samba-canção.

Naquela reunião, em especial, Seu Tavares contava eufórico, a sua participação em um conjunto musical e a noite em que foram fazer serenata a uma jovem, moradora dos arredores. Porém para decepção geral a ingrata não se apresentou à janela.

As horas voavam, e o entusiasmo do seu Tavares, talvez graças ao vinho, aumentava. Aumentava também a minha curiosidade em saber qual instrumento o Seu Tavares tocava no grupo musical. Ao que ele prontamente respondeu :"...eu era o crooner " e soltou a voz em ..."Marina morena voce se pintou.." ninguém tinha dúvidas que perdeu muito a moçoila ao não abrir a janela e aplaudir ..."acorda minha doce namorada"...

E a noite se ia com seu Tavares cantando e nos encantando. Para tirar minhas dúvidas perguntei se era ele o interessado pela moça malvada da janela, ao que ele respondeu:..."não, meu interesse era por uma colega do conjunto". Fiquei pensando se teria sua tentativa de romance tido o mesmo insucesso do seu colega da malfadada serenata. Desta vez não precisei nem perguntar. Ele foi logo contando:" um dia fui procurar a minha bela da banda em seu apartamento, ao prenúncio de tal revelação, todos nós emudecemos, quando então seu Tavares, com olhar cansado, mas cheio de malícia, continuou contando: ...ela apenas recebeu-me à porta dizendo que no dia seguinte iria partir. Pediu-me para ir visitá-la e despedindo-se entregou-me um pequeno cartão com o letreiro -"FLORDELIZ - Rio de Janeiro - Atriz"

CEIÇA
Enviado por CEIÇA em 30/06/2012
Reeditado em 03/09/2012
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