A ÚLTIMA CARTA
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Minha correspondência está toda molhada e jogada ao chão. Os carteiros de hoje em dia, salvo raras exceções são irresponsáveis, preguiçosos, mal humorados e mal amados. Não fazem entregas com carinho e amor, muito menos amizades, não cumprimenta ninguém, parecem robôs, sempre no automático. Já falei do Onofre? Rapaz raquítico, feio, dentuço. Chovia torrencialmente, aquele carteiro tentava ficar em baixo de uma marquise pra não se molhar. Protegia sua mala na qual carregava as correspondências para as devidas entregas. Moro num pequeno sobrado, e da janela de meu quarto, observava a cena. Desci abri a porta, convidei-o a entrar até que a chuva parasse. Convite aceito tomou um café quentinho, na qual agradeceu. Conversamos sobre sua profissão, seu aprendizado de vida, dificuldades profissionais e pessoais. A chuva parou. Chegou à hora de voltar às ruas e continuar seu trabalho. Todos os dias pela manhã tornaram-se hábito tomarmos um cafezinho quando ele passava por aqui. A amizade foi crescendo, admirava sua forma de trabalho. Atencioso, educado e paciente com todos, correspondência particular fazia questão de entregá-la pessoalmente. Tinha amigos e admiradores por todo o bairro. Todos gostavam dele, os dividendos era carinho, amor além de ganhar roupas, sapatos e até gorjetas. Assim passaram-se alguns anos, um dia viajei ficando fora por quinze dias. Na volta e no dia seguinte não vi o carteiro, passou a semana e pensei “Só pode estar de férias”. Após trinta dias achei estranho, parei o novo carteiro e perguntei sobre o amigo. Cadê o Onofre? O Senhor não sabe? – Não, aconteceu alguma coisa? Respondi. Sim, ele foi atropelado ao atravessar correndo uma avenida, e em conseqüência dos ferimentos não resistiu e veio a falecer. Fiquei sem ação. Aproveitou o momento e entregou minhas correspondências. Uma delas chamou minha atenção. Abri o envelope e li o texto: Prezado amigo, o motivo dessas linhas, é agradecer sua amizade, acolhida e generosidade. Fui promovido e farei serviços internos. Sentirei saudades e quando apertar meu coração visitarei o bairro onde por cinco anos fui totalmente feliz. Abraços do amigo Onofre. Ah! Dê um beijo em Dona Lazinha por mim. (Lazinha é minha esposa). O novo carteiro continuava parado em minha frente, não deu para disfarçar minhas lágrimas. Perguntei: A data é anterior ao falecimento dele, como pode? Sim meu senhor, ele escrevia em suas folgas de horário, ou nas manhãs quando chegava antes do horário, todas as pessoas de quem ele gostava receberam as cartas, e como ele já não está entre nós, fizemos uma vaquinha pra realizar seu desejo em postar todas suas cartas, são mais de 300. Agradeci e subi os degraus de minha escada, como se tivesse um peso nas pernas. Desolado.
Minha correspondência está toda molhada e jogada ao chão, não temos mais Onofre. Pequena homenagem que faço a todos os carteiros do mundo sabe, ainda existem alguns Onofres e talvez um deles possa estar batendo a sua porta. Faça sua parte, trate-os com carinho, não perderás. Abraços.
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BILLY BRASIL – 22-10-2012 – 05,33 HS – SEGUNDA – PQI-SBC-SP

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