ZÉ - Parte 07

Deitado na cama junto à janela aberta, Zé olhava o céu coalhado de estrelas.

Era noite avançada e Antonio, na cama ao lado, dormia a sono solto. Tinha sido um dia cheio de coisas novas.

Zé estava impressionado com a beleza do lugar. Mais ainda, com a hospitalidade daquela família.

Naquela tarde, passeando pela propriedade, conheceu detalhes sobre os novos amigos.

Descendente de famílias italianas, o casal havia se conhecido em Asti, provincia de Piemonte. Foi na comemoração do Festival dos Festivais, em que a jovem Jeane, em traje de época, participou do desfile impressionante, representando os valores e as tradições daquela terra magnífica. E naquele domingo de setembro, Valdemiro foi seduzido pela beleza da jovem, vestida em traje longo de veludo azul. Os cabelos claros presos em tranças e nas mãos um ramo dos vinhedos das colinas, berço do famoso vinho Astigiano. Emoção brotando, Valdemiro pressentiu ter encontrado sua amada.

Acompanhou o desfile, quase perseguindo a bela jovem, pelas ruas estreitas e nostálgicas da pequena cidade. Viu-a, ao final, encontrando-se com aquele que soube, mais tarde, ser o seu irmão. Daí a descobrir quem era, onde morava, foi um passo.

Casaram-se três anos depois, primeiro em Asti e depois, no Brasil, na fazenda de Valdemiro, há dezenove anos passados.

Preocupados com os filhos pequenos e cuidados da fazenda, foram poucas as vezes em que retornaram à Itália.

E agora, filhos já crescidos, tinham planos de fincar raízes por alguns anos, talvez, em terra italiana. Desejavam que os jovens descendentes pudessem conhecer melhor suas origens. Foi um plano cuidadosamente traçado pelo casal.

E nesta noite, Zé pensava em tudo isto. Recebera a proposta de cuidar das terras, durante este tempo. A conversa estendera-se durante todo o dia e avançara noite adentro.

A sintonia de caráter deixou a todos, confiantes. Antonio, sabiamente, limitava-se a observar. Conhecia os dois amigos e isto lhe bastava.

Jeane e Valdemiro, conduziram os dois, já bem tarde, ao quarto de hóspedes. Todos estavam cansados, mas felizes pela conversa e planos traçados.

Ao se deitarem, Antonio, logo caiu em sono profundo e Zé, agora, pensava na mulher, no filho. Sentiu que seria feliz ali, mas o que faria de sua propriedade? E a estrada, logo a ser construída bem no meio de suas terras? Bem que tentara falar disto com Antonio, mas este, como sempre, apenas olhava, sorria e nada dizia. Parecia até, alheio à sua aflição? Antonio era mesmo, difícil de decifrar.

O sol, batendo em cheio em seu rosto, acordou-o. O quarto, vazio, nem sinal de Antonio. Após uma chuveirada para apagar o resto do sono daquela noite cheia de perguntas não respondidas, encontrou o casal e Antonio, sentados à mesa de café.

Sua cabeça zunia de preocupação. Mal conseguiu disfarçar para o trio sorridente. Ansioso, pouco provou da mesa farta. Jeane parecia a única a perceber sua inquietação. Terminado o café, ela retirou-se discreta e os homens se levantaram para mais um passeio, desta vez, pela plantação.

Valdemiro foi o primeiro a iniciar a conversa.

_ Dormiu bem, Zé? Parece preocupado. Será pela conversa de ontem?

Sem deixar que Zé respondesse, Antonio foi adiantando: _ ainda não terminamos a conversa, Zé. Valdemiro tem uma condição para que você venha cuidar da fazenda.

_ Vou ser direto, falou Valdemiro, tenho uma importante condição para aceitá-lo aqui.

Zé engoliu em seco. Os dois amigos, agora parados, olhavam seriamente para ele. Antonio, espremia os olhos, naquele jeito típico de alguma coisa séria a ser dita.

_ Zé, minha condição é única e sem possibilidade de negativa. Quero que ouça com atenção tudo o que tenho a falar. Antonio me falou o quanto você gosta de sua terra. Minha condição é que você a venda. Só assim, poderei recebê-lo aqui.

Zé sentiu o chão lhe fugir aos pés. E Antonio, impassível, não dizia nada?

Turbilhões de pensamentos lhe ferviam na cabeça. De repente, sentiu o rosto queimar pela indignação e desconcerto. Não sabia o que dizer, o que fazer. Num impulso, tirou o chapéu e passou a mão pelo suor que lhe escorria pela face. Sentiu uma vontade danada de sair dali. O que acabava de ouvir era o que de pior poderia esperar. Vender sua terra sem mais nem menos, apenas para trabalhar para aquela família?

Era para isto que Antonio o trouxera ali?

Sentiu-se traído e numa última esperança de estar enganado, olhou para Antonio.

Este, parecia não se dar conta da gravidade e, muito pelo contrário, parecia achar divertido.

_ O que tenho a dizer, é que ....

Valdemiro nem o deixou terminar.

_ Só lhe faço esta proposta, porque Antonio me aconselhou e acho ser o melhor para todos.

Como assim? Melhor pra quem?

Antonio, neste momento, decidiu falar.

_Zé, está lembrado do que falamos sobre o cedro?

Agora é que Zé não entendia nada mesmo.

_ Escuta tudo o que Valdemiro tem a falar, Zé.

Só depois você diz se aceita ou não.

Nuria Monfort
Enviado por Nuria Monfort em 17/04/2013
Reeditado em 17/04/2013
Código do texto: T4244630
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