O bom moço

Ele nascera com sorte, olhos verdes, pele morena, sorriso alvo e uma lábia de malandro de carteirinha.

Desde pequeno já sabia que um sorriso ou uma carinha de choro e ninguém acreditaria que foi ele que derrubou a amiga da creche por causa daquele brinquedo novo que acabara de chegar.

E assim foi pela vida afora, um sorriso aqui, um olhar calculado ali e sempre se saia bem, seja de qual enrascada fosse.

Mesmo quando passou uma temporada na FEBEM, conseguiu ter mordomias. Por conta de já ser alto e aparentar mais idade do que tinha e despertar desejos libidinosos naquela mulher horrenda e sebosa que era a guarda do bloco das meninas, ele dera um jeito de chamar atenção em um dia de filmagem para uma reportagem de TV. Se comportou como um anjo, abandonado a falta de sorte, uma vitima dessa sociedade injusta.

Nesse dia Maria Madalena o viu e ele despertou nela sentimentos que ninguém poderia saber, a não ser os dois. Passou a ganhar cigarros, doces, comida de primeira em troca de uma comida de quinta, mas que fazia crer ser uma iguaria.

Quando saiu de lá a idiota queria continuar a vê-lo, mas ele deu um jeito de nunca mais vê-la.

Hoje faz 50 anos que sua mãe lhe pôs no mundo, na beira de um cais, com a ajuda de uma parteira que mais parecia uma bruxa das histórias da carochinha.

Não se arrepende de nada que fez na vida, a não ser de pensar com mais clareza de que um dia envelheceria. Seus olhos ainda eram verdes, seu sorriso ainda tinha a expressão que ele precisasse no momento. Mas agora, para pagar o aluguel daquele quarto da pensão de quinta categoria em que vivia, só dando golpe em velhinhas desavisadas.

Com sua lábia, conseguia ter a confiança delas, servir de ajudante para serviços domésticos como levar o cachorrinho para passear, fazer um chá ou até mesmo ler um livro inteiro de poesias, com declamação e tudo. No final conseguia obter a senha do cartão do INSS e fazer a limpa na conta, mas quase sempre o que conseguia mal dava para pagar suas necessidades de um mês.

Ah! Mas hoje a sorte mudou, conheceu Angelina uma senhora muito bondosa, perfumada e muito, muito educada. Que a mais de dois meses frequentava, dando a ela toda atenção, carinho e dedicação que uma senhora de 80 anos precisava. Afinal ela era só, tinha herdado do marido uma pequena fortuna e deixava todo o seu dinheiro numa poupança, porque sempre ouvira que a poupança era a melhor forma de guardar seu dinheiro. E hoje por ela estar impossibilitada de ir ao banco, por conta de um tombo que levou com um tapete que sem querer estava no lugar errado ao lado de sua cama, ele gentilmente iria realizar o saque para ela.

Com certeza se veriam de novo no inferno!