Uma unica esperança

As andorinhas passeavam pelo céu azul de Brasília, enquanto um velho homem sentado na pracinha distribuía comida para os pombos, seu aspecto era sereno e manso, fiquei ali percebendo o quanto aquele homem estava concentrado em sua tarefa. Ao meu redor estavam andando pessoas apressadas, algumas delas de olhares cansados e outras nervosas, pareciam um grande evento astrofísico e eu ali observando cada individuo passando, indo e vindo, por direções diversas. Eram 9h30min da manha e estava com minha maleta repleta de produtos farmacêuticos, eu era um representante e tudo que estava na minha maleta era tudo que tinha para viver. Estava angustiado, fazia mais de um mês que não vendia absolutamente nada, minha reserva estava acabando, como eu iria me sustentar? Não tinha perspectivas de nada, estava a um passo de me atirar de um abismo. Minha mulher Anita, tinha me deixado há três meses e levado meus filhos para casa fria e distante da mãe dela no sul do país. Fazia um tempo que Anita não atendia meus telefonemas. Ali parado, vestido em um terno sujo e amarrotado achei convidativo assentar com o velho homem que alimentava aquelas aves. Sentei ao lado, menos de um minuto ele me deu um saco com um pequeno pedaço de pão para os pombos mesmo sem ter falado nada, eu sabia que ele queria que eu o ajudasse na sua tarefa mimosa de alimentar aquelas aves. Sem demora comecei a fazer o mesmo em um sincronismo harmonioso. Depois de algum tempo eu perguntei.

- Faz isso o dia inteiro? – Ele nada falou, tentei por varias vezes conversar com ele, apenas o silêncio e nada mais. Depois de três horas ali com ele observando os pombos e em consequência as pessoas, eu estava, mas tranquilo, parecia que todos que passavam estavam desesperados por seguir na luta pela sobrevivência, eu e o velho, ali sentados, éramos como dois desocupados estranhos, mas sobre tudo estávamos conseguindo respirar e enxergar o mundo. Ao findar, o homem levantou, sem se despedir foi embora, em passos lentos sem olhar para trás, deixando apenas dois sacos para que eu continuasse. Não demorou muito fui embora, porém no outro dia estava eu lá, de terno sujo amarrotado e minha maleta carregando os produtos farmacêuticos e os alimentos para os pombos, eu esperei por um tempo para ver se o velho homem apareceria novamente, contudo isso não aconteceu, eu então continuei, continuei e continuei, quando acabou o alimento dos pombos segui para meu enredo de trabalho. Todas as farmácias recusaram meus produtos, eram remédios caseiros de grande efeito positivo, mas eles sempre usavam da mesma desculpa, estamos cortando alguns remédios, volte daqui uns meses. Eu olhava para dentro de mim, sentia-me um lixo, um péssimo vendedor, era nessa convicção que vendia meus produtos. No começo eu vendia muito bem, mas depois por alguma variável não estava mais vendendo como antes, minha motivação foi se perdendo, e com isso, transformei meu talento em um grande lamento. Estava com os últimos recursos financeiros para pagar minhas contas, mas duas semanas e não teria mais nenhum dinheiro. Fui novamente à pracinha, sentei e com o pouco dinheiro que tinha comprei mais alimentos para os pombos. Fiquei ali a tarde inteira. Voltei para casa e no dia seguinte fiz a mesma coisa, agora sem terno, vestido mais a vontade com minha maleta de produtos farmacêuticos acompanhada de alimentos de pombos. Comecei então a perceber como as pessoas andavam, falavam ao telefone e se comportavam em suas rotinas, foram longos três dias vendo aquilo, parei de ir vender meus produtos para as farmácias durante aqueles dias. Fiquei apenas observando. Cada minuto era precioso para mim. Aqueles pombos como sempre se preocupavam apenas com as migalhas, mas eu não estava mais preocupado em apenas vender minhas migalhas dentro da minha maleta, agora já tinha algo para entender, o individuo humano. Passaram os dias e só tinha 30 reais para me manter, tinha gasto o resto da grana com minhas necessidades, mas a maior parte do dinheiro foi investida em comida de pombos. Estava ali novamente sentado no banco da praça, sem terno, vestido de maneira informal, mas elegante, com nenhum patrimônio, sai correndo para casa, tomei um banho, lavei meu terno, o passei e vesti. Com os trintas reais comprei alguns produtos capilares e um perfume, deixei as horas passarem, quando eram 19h00min, momento que as pessoas, aquelas mesma apresadas, que não tinha tempo e andavam sempre em linha reta, nesta hora elas chegavam em casa do trabalho. Fui para rua bater de porta em porta, foi exatamente naquela noite que visitei vinte casas, vendi apenas um dos meus produtos caseiros. Os produtos que tinha eram bem variados, desde energético a creme para massagear. Mesmo vendendo naquela noite apenas um dos meus 400 produtos estava feliz, tinha concretizado uma venda de sucesso, na noite seguinte fiz o mesmo e foram mais cinco produtos vendidos, continuei e continuei, fui atrás dos meus clientes potenciais, com o dinheiro que ganhei, investi mais no meu visual e na qualidade do produto, logo fui ganhando a confiança de cada um, porem uma das coisas que tinha mais medo era deixar de fazer o que mais gostava que era dar comida aos pombos, pois pela manha e a tarde tinha que arrumar as novas embalagens que mandei fazer com meu telefone e e-mail, foi quando refleti a respeito, não posso ser feliz sem antes fazer o que me faz feliz. Recomecei a pensar sobre a gestão de tempo na minha vida e a capacidade de produção que poderia ter, bem dormia até as 9h00min da manha e saia de casa ás 19h00min, eu então comecei há acordar um pouco mais cedo repensei sobre meu modo de produção, então desenvolvi uma nova posição. Pela manha eu alimentava os pombos, a tarde fazia meus afazeres e a noite vendia. O tempo que estava ocioso eu transformei em tempo de produção, são aqueles momentos que gastamos mais preocupados em como vai ser o dia e em como o cliente vai se comportar, foi quando refleti a respeito e em vez de pensar como seria meu dia e os clientes eu comecei a ter atitude para transformar meu dia em como eu queria que fosse e ser uma pessoa mais positiva para atrair pessoas positivas, assim o tempo que gastava a tarde pensando a respeito disso, eu produzia. Com o tempo, eu estava abordando cliente por cliente de maneira feliz, positiva e direta. Foi um sucesso. Um dia sentado dando alimento aos pombos percebi que os clientes não estão dispostos a ter a mesma abordagem de antes, tradicional e cheia de conceitos, querem soluções e conforto. Aqueles farmacêuticos que antes recusavam meu produto no passado logo viram meu modo mais feliz de ser, surpresos, me deram ouvidos, quando contei as qualidades e benefícios dos produtos e não me preocupei com o preço ou o que eles iriam dizer a respeito do que eu estava fazendo ali, passaram a serem meus clientes. Com o tempo o negócio se tornou rentável, forte e com clientes fieis.

Em uma manha fui novamente dar comida aos pombos e vi o velho ali sentado. Sentei ao seu lado, percebi que o saco de alimento de pombos dele tinha acabado, peguei um dos meus e dei para ele, para minha surpresa ele sorriu.

Quando terminou de alimentar os pombos ele disse: às vezes esperamos que alguém fale algo para que possamos enxergar alguma perspectiva, algum destino ou futuro, mas somente nós podemos permitir a construção de uma vida melhor. Vamos rapaz, alimente os pombos, não esqueça que de uma forma ou de outra, confiar em Deus é ser feito estes pombos, ser alimentado por Ele a cada dia.

Escrito por: Davi Alves

Davi Alves
Enviado por Davi Alves em 31/07/2013
Código do texto: T4412973
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