O menino que não era príncipe

O Menino Que Não Era Príncipe

Berná Fiuza

Desde mais tenra idade ele já sentia raiva do próprio nome Alphonso Louis, quando lhe chamavam pelos dois nomes de batismo fingia-se de surdo. Não poderia ter sido apenas Afonso, ou somente Luis. Soube por Tina, a cozinheira, que quando ele nasceu seus pais tiveram uma briga feia por causa de seu nome. A mãe venceu. Queria por que queria que o filho tivesse nome de príncipe. O pai resignado não teve outro jeito senão ceder, mas demonstrou claramente seu desagrado pelos nomes escolhidos. Por sua vontade teria sido Tiburcio, enchia-se a boca ao pronunciá-lo.

Enquanto o garoto se martirizava com o próprio nome, a mãe só preocupava-se com compras, cabeleireiro, massagens, tomar chá com as amigas, shopping, festas etc. E o pai voltado aos negócios e reuniões, nunca tinha tempo para ele. Desde que nasceu só fora cuidado por babás. A mãe nunca lhe amamentou, raramente lhe tomou ao colo. Somente Tina importava-se com ele dispensando-lhe uma atenção especial. Sagaz, ela percebeu logo que o menino em seus primeiros anos de vida já odiava os próprios nomes. Já que a mãe em sua empáfia lhe queria com nomes de nobres, em sua ausência, ela passou a chamá-lo de príncipe. Até que ouviu uma conversa entre ela e a copeira falando de um prato especial que ela ia preparar para o príncipe, porque o príncipe adorava aquele prato. A mãe ao ouvi-la falando príncipe para cá, príncipe para lá, Indagou-lhe logo quem era o tal realeza? Ficou cheia dos dedos quando soube que o tal príncipe era seu próprio filho.

Porém, a mãe tinha-lhe que estragar o apelido que tanto gostava, quando passou a chamá-lo Alphonso Louis, meu principezinho.

Seu pesadelo começava mesmo quando principiava o ano letivo. Sempre achava, ou melhor, tinha certeza, de quando a professora sucessivamente começava a chamada que chegava ao seu nome, era um dos primeiros; ela levava a mão á boca para disfarçar o sorrisinho de mofa, assim como toda a classe gargalhava. Tinha a nítida impressão que lhes apontavam o dedo. Ele encolhia-se todo. Ah se ele tivesse o dom da invisibilidade! E assim o coitado do príncipe, vivia seu mal sonho a cada ano escolar.

Cursando a quinta série e novamente havia mudado de escola; nas anteriores seu rendimento escolar era de mal a pior. O pai cobrava da mãe uma investigação, ela por sua vez rebatia-lhe que o filho era uma criança muito especial, carregava em seu nome o peso da realeza por isso era pensativo cauteloso nos modos, um pouco alheio aos estudos; característica de fidalgo. O pai argumentava que ela vivia numa total utopia, ele era apenas umas simples criança plebéia que transportava em seus ilustres nomes a fantasia da mãe. A discussão era sempre o mesmo tema, o filho, seus nomes, suas péssimas notas e a escola. Que não os levavam a lugar algum.

Primeiro dia de aula do príncipe na nova escola, nenhum conhecido, todos os rostos eram-lhes estranhos. Procurou um lugarzinho bem solitário para ficar até tocar o sinal de entrada; quando o ouviu dirigiu-se a classe esquivando-se das crianças que o procuravam para um entrosamento, foi bem para fundo da sala vistoriando com os olhos um lugar seguro. Ufa! Parece que encontrou um ideal a última cadeira da última fila encostada á parede, bem atrás de um menino alto e bem forte. Naquele cantinho, certamente a professora não ia vê-lo sentou-se e ficou quietinho.

A pro Virginia entrou na sala sorrindo cumprimentando as crianças: - Bom dia crianças! - Bom dia pro! - Respondeu a classe em coro. - Que bom tê-los aqui comigo mais este ano! - Nós também pro, estamos contente de tê-la novamente como nossa professora! - Algum aluno novo? - Parece que não pro. Respondeu uma aluna da primeira fila. - Vou começar a chamada prestem atenção para não levarem faltas!

- Abigail Ferreira - Presente! - AÍD Martins - Presente! - Alice campos - Presente!

- Alphonso Louis Durão! (...?) Pronto desabou seu mundo, ele encolheu-se todo, enterrou a cara na carteira como uma avestruz para não ver os olhares de consternação dos colegas, sabe Deus até da professora! Era bem melhor passar por avestruz que suportar tamanha vergonha. Cobriu os ouvidos com as mãos para não ouvir os risinhos de mofa da classe. Deus por que ele não morria naquela hora. - Alphonso Louis Durão.

- Insistia a professora. - Deve ser algum aluno novo é a primeira vez que vejo seu nome na minha lista de chamadas. Será que ele não veio hoje crianças? - Tem um menino novo aqui pro, ele está sentado na última carteira atrás do Décio.

Dedurou uma aluna magricela do meio da Classe. Ah, mas ele odiou a fofoqueira, se tivesse visto seu rosto ela ia ver o que era bom falar demais! A professora dirigiu-se até ao fundo para ver quem era o garoto escondidinho. Podia apostar que ele adormecera. Ele ouvia o barulho do salto sobre o piso toc, toc, toc, cada vez mais próximo dele. As lágrimas quase lhe vinham aos olhos. Seus lábios tremiam, as mãos gelaram, gotículas de suor impregnavam sua testa. Sentiu um toque suave em seu ombro, o aroma adocicado de colônia penetrando-lhe as narinas, o farfalhar de uma cascata dourada roçando-lhe a face, uma voz sussurrou ao seu ouvido enquanto uma mão delicada acarinhava-lhe os cabelos. Ele pensava febrilmente: Morri de sofrimento e de desgosto por ter estes nomes agora estou no céu. Por isso este anjo ao meu lado, ouço sua voz. Tomara que Deus me deixe voltar com outros nomes escolhidos por mim. - Meu bem você esta sentindo alguma coisa ou é só sono mesmo? - A voz do anjo cochichava-lhe ao ouvido. Ele levantou a cabeça sentindo-se um boi indo para o matadouro. No entanto, aquele raio de sol aqueceu-lhe a alma, foi á visão mais linda que já vira ao longo de seus onze anos; um par de lagos azul os fitava com simpatia e um sorriso caloroso envolveu-lhe o ser. Sorriu-lhe também timidamente; foi mais um repuxão no canto da boca que um sorriso. A voz melodiosa do anjo ainda em sussurros. - Qual seu nome amor? Ele ficou mortalmente pálido, decididamente era seu fim. O anjo aproximou mais ainda sua boca do seu ouvido num tom que ele mal ouvia insistiu-lhe. - Qual seu nome amor por acaso é Alphonso Louis? Toda sua valentia foi para o espaço, às lágrimas logo lhe caíram, seus lábios tremeram mais ainda esticados em bico. Fez um gesto de cabeça afirmativo, falou baixinho, mas baixinho mesmo que o anjo teve que curvar-se mais ainda para ouvi-lo. - Príncipe. O par de lagos o estudou por segundos que lhe pareceu uma eternidade, sorriu-lhe mais aberto, mexeu levemente em seus cabelos. - Eu sou Virginia, sua professora. Fez levantar-se da carteira, com descrição e delicadeza enxugou suas lágrimas com a palma da mão. Falou alto, para que toda a classe pudesse ouvi-la:

- Crianças, esse é o Alphonso Louis, mas todos o chamam de príncipe! Ele não respondeu a chamada por terem escrito seu nome errado na lista. Vamos dá-lhe boas vindas. - Oi príncipe seja bem-vindo! - Exclamaram as crianças em conjunto.

Sorriu satisfeito por aquele minuto luminoso. Ela tirou-lhe o fardo dos ombros. Sempre ia amá-la, passasse o tempo que passasse. Sentiu-se muito bem, tendo todas as cabeças voltadas para ele chamando-lhe de príncipe. Respirou fundo. Tornou-se outro garoto, renascido para glória. A partir dali, conversou com todos, sorriu, deu gargalhadas, sob olhar perspicaz da professora. Quando findou a aula a pro Virginia chamou-lhe pediu sua agenda do estudante, escreveu um recado para seus pais. - Logo que chegar a casa, entregue a agenda a um de seus pais. Assim que ele deixou a sala de aula ainda no corredor da escola, não resistiu á curiosidade, precisava saber o que a pro tinha escrito naquela agenda aos seus pais? Tirou-a da mochila e leu o bilhete: “Prezados pais, solicitam seus comparecimentos amanhã sem falta. Na impossibilidade de virem os dois, pelo menos um. Assunto referente ao seu filho príncipe”. Por um lado, ficou muito contente pela professora ter escrito seu filho príncipe, por outro, muito apreensivo. Perdera a conta das escolas por onde passou. Será que era sobre seu fraco conhecimento das matérias, seu comportamento, sua dispersão na aula? Não, não, não podia ser, foi seu primeiro dia de aula! Pensou em não mostrar aos pais, no entanto refletiu, era capaz de não dar certo a professora podia muito bem mandar outro recado cobrando a presença deles, logo saberiam que ele não entregara o primeiro. O jeito mesmo foi mostrar-lhes.

Na manhã seguinte a mãe estava na escola trancada na diretoria com professora Virginia e a coordenadora, ficaram por horas em reunião. Mordendo as unhas ele aguardava a mãe, sentado no bando do corredor. Vez em quando ouvia longe a voz da mãe bem alterada. Quando já sentia seu traseiro dormente de estar sentado naquela bancada há hora, a mãe furiosa com passos decididos saiu da diretoria, agarrou-lhe a mão puxando-lhe para fora da escola. - Vamos! Vou resolver esse assunto agora mesmo! Ele a seguiu quase arrastado não estava entendo bulhufas de nada. O que ele fizera de errado? Muita zangada ela entrou no carro dirigia em silêncio. Ele em agonia morria de medo de perguntar-lhe algo, sem saber ao certo o que tinha feito para aborrecê-la tanto. De repente ela parou o carro e... - Por que quer mudar seu nome?

- Ahn! - Por que quer mudar seu nome?

Ele permaneceu em silêncio, tentava raciocinar rapidamente pensando: Como assim mudar meu nome? Será que tinha jeito? A mãe o vendo calado prosseguiu falando como se ele tivesse-lhe respondido. - Seu nome é de reis. Saiba que me deu muito trabalho achar dois nomes de realeza que combinassem e fossem bonitos. - Que combinassem mãe tem dó! Nem Afonso é e sim Alphonso e para que Louis, não podia ser simplesmente Luis como todo Luis? - Qual é o problema Alphonso Louis, meu principezinho? São nomes aristocráticos! - Mãe, pode até ser aristocrático, mas eu morro de vergonha deles! Já pensou mãe, Alphonso Louis! Todos meus colegas têm nomes comuns, eu não quero ser príncipe quero ser uma criança normal! - Mas Alphonso Louis, principezinho são nomes de pesos. - Mamãe é por isso que eu vivo cansado! Por que não posso ser simplesmente Afonso Luis, ou somente Luis?

A mãe fez um drama, antes de respondê-lo. Seria uma ótima atriz se tivesse seguido carreira. - Você me corta o coração principezinho, renegar os nomes que a mamãe escolheu para você com tanto carinho, muito, muito antes que nascesse. Ainda, eu ou seu pai fomos intimados a participar de todas as reuniões de pais e professores. Como ele nunca tem tempo vai sobrar para mim. Não quero nem pensar no pesadelo que vai ser se cair nos dia que vou tomar chá com minhas amigas, que vou ao cabeleireiro, ou mesmo nos dias das minhas massagens. - Não fique triste mamãe, se você é muita ocupada a ponto de não poder participar de nenhuma reunião lá na escola, vai fazer o quê? - Mamãe é muito ocupada mesmo, mas vou ter que ir principezinho! Ou você quer que sua professora metida a psicóloga infantil, acuse-me novamente de ser uma mãe que não se preocupa com os problemas do filho, indiferente e fútil. Sabe o que ela perguntou-me, se eu lembrava-me da última vez que lhe fiz um carinho? Eu principezinho, que vivo fazendo-lhe carinho com o olhar. - Só se for com o olhar mesmo mamãe, eu não me lembro de outra forma. - Principezinho, não seja injusto com a mamãe! Eu tenho que ficar sempre jovem, bonita, cheirosa para você. Não ia querer ver sua mamãe feia como uma bruxinha, de avental na cozinha fedendo a gordura? - Na verdade eu preferia mamãe, você feinha fedendo a gordura fazendo-me os bolinhos que a Tina me faz e contando-me ás histórias que ela me conta. - Você é muito injusto com a mamãe principezinho! Quem foi que lhe deu a Tina hem não foi à mamãe? Justamente para ela fazer-lhe o que a mamãe não pode! A mamãe não pode por uma criança sujinha em seu colo? - Mesmo que essa criança sujinha seja seu único filho? E quando essa criança está limpinha e cheirosa? - Ai essa criança limpinha e cheirosa vai amarrotar a roupa da mamãe. Tina está ai para isso principezinho, para fazer as comodinhas que a mamãe não pode lhe fazer os carinhos que a mamãe muito ocupada não tem tempo de lhe fazer! - Mas mãe, você vai mesmo as reuniões da escola? - Tenho que ir! Também vou dispensar o ônibus escolar, a partir da próxima semana seu pai o leva eu o busco. Vamos fazer esse terrível sacrifício para não deixá-lo estressado, segundo a sua professora inserida a entender o comportamento infantil. - Mãe não eu acredito é verdade!? - É para lhe provar que me importo com você. Embora contrariada, eu vou fazer-lhe a vontade. - Que vontade? - Que vontade principezinho, mudar seu nome! - E pode?! - Pode que nome escolheu? - Então posso escolher? - Sim Alphonso Louis, meu principezinho é você quer mudar seu nome.

Ele ficou um tempo pensando... Pensando... - Mamãe, já que você gosta tanto dos nomes que me escolheu, eu posso ficar com eles mesmos?

A mãe ficou feliz e aborrecida ao mesmo tempo. Todo aquele escarcéu para ficar com os mesmos nomes. – E a tal vergonha que sente deles? – Mãe quando a pro Virginia fala meus nomes eu não sinto mais vergonha. Era só o que lhe faltava, a professora lhe chama pelos nomes que ela lhe escolhera com tanto carinho e ele não tem vergonha. Agora quando ela o chama... O que está acontecendo, o que se passa na cabeça deste menino? - Mamãe! - O que é agora fofinho qual é o problema? - Mamãe!

- Sim meu fofinho! - Posso continuar a ser príncipe, quero dizer, que as pessoas me chamem de príncipe? - Mas é claro meu fofucho! - Mamãe! - sim fofucho. - Você continua a chamar-me de principezinho em vez de fofinho ou fofucho? - Se é sua vontade principezinho!

Tanto trabalho para nada! Levantou-se cedo para ir a tal reunião com a professora metida achando ser algum problema sério. Sua pele devia está horrorosa sem suas horas de sono. O que este menino quer afinal?...

Berná Fiuza
Enviado por Berná Fiuza em 26/08/2013
Código do texto: T4452263
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