QUASE

Lana era feliz. E quando aqui se diz feliz, que não se imagine aquele tipo de pessoa que se alegra com uma boa nota escolar ou com um beijo. Poderia o sol explodir, o mar inundar a terra, o mal vencer o bem, que nada a desanimava de ser feliz. Era quase uma bênção ser assim. Quase.

Davi a conhecia bem e nada aqui dito é exagero, eram quase irmãos. Quase. Sim, tiveram um caso e a proximidade levou-o a conhecer seu martírio, inimaginável a quem apenas o observasse.

Ela, assim como acontecera com Davi, quase acreditou que fosse abençoada. Entretanto, as coisas inevitavelmente se transformam. Isso começou a mudar pouco tempo atrás, no velório de sua avó. Lá não derramou uma lágrima pela amada anciã. Ao contrário, estava a alegre e disso muito se envergonhou, tendo até se escondido para sorrir à vontade. Após esse dia, passou a questionar-se sobre ser tão alegre num mundo infeliz e desgraçado. Lana quase achou a resposta. Novamente, quase.

Na verdade, o que ela descobriu foi uma solução parcial que lhe permitiu fugir do problema e não a objetivada resposta. Para continuar a viver com sua felicidade em paz, ela isolou-se, criando seu mundo à parte e quase ninguém percebeu isso, pois continuava amável e alegre.

Mas Davi percebeu e quase decidiu tirá-la desse mundo por ela criado. Mais uma vez, o quase fez-se presente. Achou melhor deixá-la assim, pois, aparentemente, isso não a afetava em nada.

Só aparentemente, porque poucas semanas depois, encontraram Lana e sua tragédia consumada. Seu corpo pendurado numa horrível forca. Ele sentiu o peso de nada ter feito, porém sabia que a culpa não era dele. Foi a sucessão de “quases” que a levaram a preferir seu mundo imaginário ao mundo real. Concluiu que ambos deveriam ter banido o malfadado “quase” de suas vidas.

Março

2014

Dalva Molina Mansano
Enviado por Dalva Molina Mansano em 05/03/2014
Código do texto: T4716342
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