* Na pontinha da cama, após uma noite bem ardente, uma formosa francesa me contou uma história que considero muito surpreendente.
 
Numa pequena cidade, dessas que ninguém localiza no mapa, surgiu um padre bonitão substituindo o velho pároco o qual acabara de falecer.
Uma semana depois, o rapaz quase foi linchado pela população.
Descobriram que o padre não era padre. O tarado tentou seduzir a única virgem da cidade, a prima do namorado de Ana, a habilidosa doceira da cidadezinha.
Mais tarde correu a informação de que a virgem, a prima do namorado de Ana, já abandonara a castidade.
Essa notícia mudava o antigo perfil da cidade. Ali não existia nenhuma donzela, todas as mulheres já haviam provado a arte da bingolança.
 
Incrível foi saber que o namorado de Ana não era primo da ex-virgem. Aliás, garantem as más línguas que ele foi o primeiro a desvendar o "segredo" da falsa virgem que há muito tempo perdera a “inocência”.
Além disso, ele não namorava Ana.
O tal namoro com a animada Ana era um pretexto do sagaz rapaz para pular a janela da irmã de Ana quando o maridão, o vereador Romualdo, esposo corneado da irmã de Ana, saía para trabalhar, nove horas, nas terças e quartas (excetuando os feriados e dias chuvosos).
 
Ana queria, utilizando o artifício o qual favorecia a irmã, bingolar com Alfredinho, o moço sabido, orgulho da cidade, estudante de Direito.
Depois a população ficou boquiaberta descobrindo que Alfredinho não estudava Direito direito. Na realidade o grande enganador só foi à escola na infância e ainda repetiu três vezes.
Todos os dias o boêmio safado visitava os bordéis das cidades vizinhas e, no término da tarde, se encontrava com Ana executando assim sua principal bingolada.
 
* Tantas revelações deixaram a cidade impregnada de má fama.
Nada ali parecia ser verdadeiro.
Por exemplo, Ana que, durante o dia, vendia deliciosos doces não sabia fazer doce algum. Até brigadeiro, comprado nos mercados, a moça tinha dificuldade de preparar.
Quem fazia os doces era a tia de Ana, Dona Carminda, que aceitava a farsa para que a sobrinha não contasse a sua paixão por Riberval.
 
Riberval era um cidadão misterioso e temido. Diziam que ele era um assassino cruel o qual escolheu morar na cidade para fugir da Justiça.
Outro terrível engano, a francesa sorridente afirmou.
Riberval era um tremendo covarde que engravidou uma bonita jovem fazendeira na sua cidade natal.
O pai da rapariga exigiu o imediato casamento.
Temendo o compromisso, o pilantra fugiu e adentrou a primeira cidade que encontrou, bolando uma história a qual o povo cresceu repetindo.
 
* Apesar das várias inverdades que acompanham os personagens desse conto, tudo que eu disse é a mais pura verdade, no entanto eu comecei a narração com uma enorme mentira e, poucas linhas atrás, eu insisti mentindo.
No início eu disse que uma francesa narrou esse conto após curtir uma noite bem ardente comigo Depois falei que a gata sorrindo revelou que Riberval, além de ter um nome horrível, mentiu sobre o seu pretérito.
Jamais experimentei noites ardentes com francesas.
 
"Por que você mentiu, bigodudo?"
Eu menti para dar charme ao conto.
As francesas são charmosas pra caramba.
Fica legal apresentar uma francesa narrando.
Devo esclarecer, valorizando o ambiente de verdades o qual começa a nascer, todavia, que não sou bigodudo. Nunca tive bigode.
 
“Como assim? Que papo é esse?”
“Nós sabemos que Ilmar tem bigode.”
Realmente Ilmar tem bigode, no entanto eu narro o conto.
Não confundam o narrador (eu) com o autor (Ilmar).
Nesse conto as aparências enganam, ou melhor, tudo aqui engana.
No momento que o autor, o bigodudo, me criou, eu passei a definir os rumos do conto e a ditar as letras inverídicas da trama, ou seja, quem manda e desmanda na história sou eu.
 
* Suponho que saber disso aborrecerá vocês.
Alguém afirmará que sou arrogante.
Imagino que certos leitores questionarão a qualidade do conto.
Dirão que, no meio de tantas ilusões, nada, nessa história, merece ser levado a sério. Insinuarão que faço apologia à mentira.
Eu quero contestar recordando uma famosa frase:
Quem conta um conto aumenta um ponto.
 
“Você abusou! Nesse conto não temos um ou dois pontos que foram aumentados, mas um novo enredo o qual surge a cada linha.”
"Basta! Esse conto não merece credibilidade alguma, cara!”
“Vaza! Cai fora, malandro!”
 
Cara?
Onde está o cara ou o malandro?
Quem falou que o sexo do narrador é masculino?
 
Um abraço!
Ilmar
Enviado por Ilmar em 18/03/2014
Reeditado em 18/03/2014
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