Amor Sem Fronteiras

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Amor sem fronteiras,

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Benção divina

Jornalistas chegando de muito longe, com todas aquelas câmeras de alta definição, apontadas pra nós, pintando nosso jardim poluído, questionando nossa partida para o litoral:

-Fuga ou prazer?

-Os dois.

Os dois bêbados, enquanto esperávamos pelo fim da entrevista maçante. Os profissionais continuavam a perguntar sobre o que estávamos achando do sul. Matéria editada em infinitas partes, para censurar nossas palavras de baixo calão e nossas tiradas com a repórter. Ambos loucos de tanto amar, A m o r sem fronteiras.

O cenário era de grades grossas, acinzentadas, com raízes pulsantes, tentando nos puxar para o mal, mas, nós nunca fomos bons. Sempre queimávamos sonhos, desprezávamos pessoas e transávamos pra valer com quem estivesse disposto.

Por mais que não parecesse, nós tínhamos sonhos. O dele era zanzar pelo mundo, com suas drogas, preservativos, e seus grandes olhos amendoados, o meu era, simplesmente, confiar nele, como um cão fiel que cuida e confia em seu dono. Aquela sensação de solidão a dois não me incomodava, muito pelo contrário, era divina. Uma benção.

Não tínhamos lugar fixo, minha cama era os seus braços. Conheci todas as estradas possíveis e também as impossíveis. Sobrevoamos por tantas pessoas, tantos lares, tantas vizinhanças, tantos amores. E eu ainda não tinha perdido meu sorriso tímido, meio sem jeito, tentando ser simpático com quem me recebesse bem. Ele sempre extravagante, bem querido, líder nato. Me levava pra baixo e pra cima, mostrava-me galerias de arte que quase ninguém via, amava meus poemas sem utilidade, incentivando-me a escrever mais, me ensinava a amar a imperfeição e admirar pássaros sem voo.

Escalamos o tempo, enganamos as mocinhas do interior as seduzindo e depois mostrando nosso amor homossexual que chocava as sociedades mais conservadoras por onde passávamos, éramos exilados das cidades, mas tudo estava bem.

Numa tarde de quarta-feira, no meio de abril, acordei e não tinha mais ninguém ao meu lado. O coração gelou um pouco, mas imediatamente eu dava respostas lógicas à intuição. “deve ter ido a algum lugar e já volta”, “deve ter ido comprar algo pra comer”, mas as horas foram passando e não obtinha sinais. Então, resolvi sair para procurar. Estávamos hospedados em uma pousada de montanha, logo à frente vi um penhasco e, ao lado, em cima de uma pedra, havia uma caderno, corri para ver o que era. Quando abri, na primeira página, estava escrito: “Quero ser livre, amor sem fronteiras”. Fiquei estarrecido, paralisado. Era sua letra. Quando cheguei à beira do penhasco, com o sol na cabeça, me deparei com o nada, ele havia me deixado. Voltei para minha cidade, agora, sobrevivo de memórias e de uma esperança mórbida.

Lucas Guilherme Pintto
Enviado por Lucas Guilherme Pintto em 10/01/2015
Código do texto: T5097193
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