Insustentável leveza

Não queria morrer, só ficar inconsciente por um tempo, sem sentir ou pensar nada. Sabe como? Dar uma pausa nessa coisa de ser humano, nesse absurdo que é viver. Um sono longo e profundo. Um tipo de hibernação da mente.

O sonho era sempre o mesmo: Seu cérebro dava pane, homenzinhos invisíveis o reconfiguravam e, quando ele abria os olhos, tudo estava em perfeita ordem. De alguma forma, ele não se envergonhava mais de quem era. Não lhe davam mais motivos pra isso. Ele podia falar o que pensava, fazer o que queria. Em suma, podia ser livre.

Mas nunca acontecera. Fora sempre apenas um sonho – constatava o garoto quando acordava num sobressalto, suado e ofegante.

Até o dia em que fosse possível, seriam só luz e escuridão infindas para ele, alternando-se na função de impedir que este enlouquecesse mais. Entre uma bicada no café e um trago no cigarro, brincava de Criador. Seu mundo perfeito, aos poucos, idealizou. Sem bem ou mal, ser ou não ser, amor ou ódio... Sem defender nenhuma deidade, tomar partido em situações, fazer escolhas...

Era cansativo viver; vestir dezenas de máscaras para agradar a todos sem que nenhuma lhe servisse e agradasse a si mesmo. O que lhe agradaria era vestir seu próprio rosto, mas isso eles não permitiriam. Lá fora as coisas eram esmagadoras, cruéis, muita gente, tanta pressa... Mas em seu quarto, tornava-se imune. O peso excruciante de todos os dias substituído pela insustentável leveza de um momento.

11/03/2014

Thainá Mocelin
Enviado por Thainá Mocelin em 06/04/2015
Código do texto: T5196449
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