“Até que a Morte lhes Separe”

 
À marcha nupcial, entra a noiva. Vaporosa em seus véus brancos, ela é alvo de centenas de olhares admirados. O pai a conduz pelo braço, visivelmente emocionado. Não sabe nem mesmo em que direção olhar. É um homem tímido, pouco acostumado a publico e ternos. E esse terno preto que alugou para a ocasião deixa-o pouco à vontade. Mas nem é isso o pior. O problema é mesmo levar sua filha para ele... O rapaz que agora, sorridente, vem encontrá-los na passadeira vermelha...

Eu nunca fui homem de chorar em casamento. Não porque seja homem, mas porque casamentos nunca me comoveram. Mas, ontem mudei de ideia: dependendo da situação a gente chora, sim. E se emociona, sim. Quando vi o pai da noiva sufocar a própria emoção, acho que tomei um pouquinho dela pra mim. Mas não foi só isso. Foi porque pensei no que aquela menina estava fazendo de sua vida. O abraço entre genro e sogro não foi meio forçado, foi todo forçado, quem não viu? Depois, ao canto do quintal, à mesa armada para servir o jantar aos padrinhos, ele me faria suas queixas:

— Cumpade, ocê cria uma fia com todo amô, com todo o sacrifiço. Dá o de comê, levanta de noite mode oiá as febre, acudi os choro, acendê lamparina pa mostrá que a sombração é  susto de sonho ruim... A menina cresce, cê põe na escola quereno que seje gente de leitura, ensina o serviço de casa mode num fazê feio conde casá. Cê pensa que é facim, cumpade? Adispois a desmiolada se ingraça de um trem à toa que num vale uma picada de fumo. É duro, sô! É de duê cê vê a pobre levá tapa na cara mode bobage de ciúme sem fundamento. Ocê fala, ocê aprivine, ocê aconseia e nada dianta. O disgramado vem e com duas palavrinha, promessinha de nada, um tár de essa foi a úrtima veiz, passa a borracha em tudo... Num passa uma semana, tudo se arrepete. Ah, num dá não, sô!

— Compadre, eu sei. Eu sei da sua dor. Eu acompanhei a sua história com suas  três meninas, criadas com todo o dengo. Eu vi tudo que você fez por elas. E minha afilhada, coitada, foi cair nas armadilhas do que pensa ser amor.  Sei o quanto lhe custou não dar um tiro no tipo quando ele deu o primeiro tapa. Sei o quanto lhe pesou aceitar o pedido desse casamento, entrar nesse terno e conduzir sua princesa para entregar ao miserável. Mas podia fazer o quê? Amarrar, prender atrás de grade? A menina destrambelhou, ameaçou fugir, ir embora pra longe. Podia ser pior. Ela por perto você fica mais tranquilo. Não é melhor, meu compadre?

— Meiór eu não sei o que é, mais eu lhe juro, cumpade, se o cão sarnento bulir num fio de cabelo dela depois desse dia de hoje, eu lhe agaranto: o que vai valê é o tár do até “que a morte lhes separe...”.  E a separação vai sê de minha própria mão, cumpade, já comprei o 38... Tá lá em riba do guarda-roupa...