Psicografia nº 1, em cinco movimentos ligeiros

1º movimento

E quando ouvimos certas músicas, é como se flutuássemos...

Lentas, fortes, lentas, fortes, um verdadeiro turbilhão de emoções oscilantes.

E há aquelas que me esgotam.

Este meu primeiro movimento será difícil, porque eu me sinto realmente esgotado, no momento, por várias músicas que ouvi ainda há pouco. Aliás, acredito que sempre o primeiro movimento é o mais complicado de acontecer.

2º movimento

Mas, aos poucos, vai-se perdendo o medo do desconhecido – sim, porque quem dá à luz as palavras, assim, como agora, só pode encontrar o que não conhece nem nunca viu e o que não se sabe onde vai dar – vai-se perdendo o medo. No entanto, eu sempre estou me vigiando, que é para não acabar perdendo o fio.

3º movimento

Neste, começa-se a falar sobre coisas altamente sem sabor. Inúteis, mesmo. Por exemplo, conta-se que a personagem, certa vez, andava pela rua carregando sua bolsa pendurada no ombro direito. Vinha em passo lento, de não sei onde – é o que menos importa agora, diante de um fato que só é do conhecimento de quem está contando: a mulher, não muito velha, tinha uma cabeleira dignamente disposta em uma única nuance brusca, o que já se pode chamar de contraste [contraste: nuance brusca]. Tal imagem denunciava claramente a existência sufocada de cabelos negros por baixo da tintura loura – Teresinha vinha em passo lento, sob a sombra dos prédios, e eu posso muito bem dizer, sem nada mais a acrescentar, que ela esquecera o zíper da calça aberto ao sair de casa (de onde ela vinha, pronto! Para onde ia, já está além de minhas possibilidades.)

4º movimento

É o momento de decidir o que fazer, agora que já se cometeu o erro de executar os movimentos iniciais. Tragicamente clássico e inevitavelmente indispensável: a personagem, ao passar por uma mangueira, morre fulminantemente ao ser atingida na cabeça por uma manga carnuda e pesada. Alternativamente: abandono-a ali mesmo onde apareceu, deixando-a esquecida no seu eterno caminhar-sem-rumo, sempre à sombra dos prédios.

O que Teresinha prefere? Teresinha prefere? Teresinha não prefere. Nem poderia. É maior que ela, e Teresinha não suportaria escolher. Mal eu consigo.

5º movimento

O silêncio é para mim como uma nota única e que não termina até que se durma e se esqueça.

Rosiel Mendonça
Enviado por Rosiel Mendonça em 05/07/2007
Reeditado em 26/07/2007
Código do texto: T553868
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