Round One

Olá, meu nome é Roger. Eu pertenço ao grupo dos "Low Profile". Mas o que isso significa? Que além de jogar póquer muito bem, não possuo status e nem dinheiro suficiente para entrar em uma mesa "high price", mesa que só entra quem possui uma conta mais gorda que um lutador de sumô. Em uma mesa high price, só entra quem pode pagar acima de quinhentos mil dólares, e o preço final não fica abaixo de cinco a dez milhões. Consegue imaginar o que significa ser high?

Mas a história que vou contar, não é sobre eles, mas o que é o mundo clandestino dos gamblers e o que a sorte e o azar de uma noite, regada a whisky, cigarros e prostitutas baratas pode lhe causar. Não pense que desfrutamos de hotéis de luxo, lagostas e um bom vinho à noite, a única coisa que podemos almejar, é chegar vivos em casa. Um low profile como eu, vive à base de casas financiadas pela máfia, nesse caso, para lavagem de dinheiro, mas fazer o quê? O jazz é dos estilos mais prazerosos que podemos ouvir durante uma noitada, nomes como Miles Davis, Coltrane e Charlie Parker, tocadas em aparelhos de toca disco empoeirados com o mais mórbido das fumaças de cigarros.

As coisas eram diferentes anos atrás. Havia um high price que fizera questão que low profiles, pudessem participar de mesas altas, mesmo não podendo pagar tanto, apenas pela simples brincadeira. Até que esse high price chamado por todos como "Big Daddy" fora assassinado friamente em um crime encomendado. Todos os low profiles se afastaram e permaneceram nas sombras da clandestinidade. Qual é o meu papel nessa história? Vencer o novo “big daddy” e trazer paz para o mundo dos gamblers. Bom para isso, necessitaria de muito dinheiro e influência. No mundo dos low profiles, você se depara com alguns momentos de ação, como correr dos capangas e torcer para não levar tiros. Eles não aceitam muito bem a derrota. Temos quatro casas que são financiadas pela máfia. Na primeira e mais badalada, não funciona somente um complexo de pôquer, mas também um prostíbulo, o que chama mais atenção. Na segunda, é um casa afastada mais silenciosa, pois perto dali se encontra um local de despejo de corpo, todas as quatro casas despejam os corpos ali. Na terceira casa, é um hotel, apesar de luxuoso, é a casa mais cara das quatro, não só pelo preço de mil dólares, mas só entra quem é convidado. Quem comanda o hotel, é a gerência da máfia, Os Deadly Snakes, um grupo de extermínio que já apagaram centenas de low profiles. Ah! Esqueci de contar. Os high prices, são em sua maioria filhos, advogados e familiares dos mafiosos, já dá pra imaginar como ficou difícil chegar lé em cima? Um low profile como eu, conseguiria facilmente ganhar de muitos high price, mas também teria que dormir com os dois olhos abertos para sempre, uma piscada e bang!, minha vida já era.

Pra minha sorte havia um senhor que me ajudava em momentos de dificuldades, não com dinheiro, isso eu tinha para viver, transar e ser feliz. Seu nome é Juiz Mason, ou para minha pessoa, Peter Mason. Um juiz quase aposentado que se recusou se aposentar para me ajudar. Conhecia muitos dos high price e suas família inclusive muito dos advogados, mantinha a trégua em tempos de perseguição. Esse juiz sabia aproveitar o melhor da vida, não só era um jogador habilidoso de pôquer, mas sabia jogar xadrez, seu jogo favorito, como ninguém. Conhecia muitos dos melhores jazzistas e tinha uma adega em casa que fazia inveja a qualquer enólogo que se preze. Me sentia no topo do mundo junto com ele. Sua esposa já havia falecido há alguns anos atrás, então a solidão tomara conta dos seus dias. A vida sendo um low profile era diariamente, trabalhar e se considerar parte de algo, ser mais nostálgico possível. Todos os bons profiles, já foram a Vegas pelo menos uma vez na vida, é claro que, hoje em dia somos proibidos de chegar a menos de cem metros de lá. E também não admitimos pôquer online.

Como havia falado antes, minha ideia era ganhar do novo “big daddy” no grande “Round One”, ou para os mais audaciosos a “The Big Table”. Um jogo grandioso, só o preço faria minha vida e meu nome mudar para sempre, sem ser perseguido e morto. Mas para isso precisaria de quinhentos mil dólares para entrar. O Round One, consiste em jogar com o big daddy e mais dois ou três high prices escolhidos pelos chefes da máfia. Seria basicamente ganhar do Vito Corleone, tendo Michael Corleone na minha orelha com a pistola no meu saco, para quem já assistiu Poderoso Chefão. A vitória me colocaria no patamar dos high prices e me daria mais dignidade para um pôquer mais justo e não mais me sujeitar às baixarias da máfia vendida, suja e corrupta, tá Ok!, que que eu to falando? Não mencionei, apesar de viver em Water Hill, me sinto em Gotham City sem o Batman ou o Gordon pra me salvar, mas ganhar do big daddy, seria algo a se comemorar. Com a ajuda do juiz Mason, prossegui com a minha empreitada, rumo ao impensável.

Sobre as quatro casas financiadas pela máfia, o Hotel Golden Palace, apesar de muitos fantasmas e um zelador psicótico, tinha a melhor mesa. Poderia começar por lá. Juntei minha economias e tomei banho e troquei de roupa. A mesa já estava pronta quando cheguei. Michael Corleone parecia meu melhor amigo perto do zelador psicótico com um machado no meu saco. Sentei e recebi minhas fichas. Jogo se inicia, cartas pra cá e fichas voando para todos os lados, havia uma certa calma inicialmente. Apostei quando precisava, acreditei até onde podia, e consegui tirar o melhor proveito de todos as mesas que joguei. Em cada casa tinha um chefão para ser destruído como em jogo de video game. E no Hotel Golden Palace, que mais parecia um bar de jazz dos anos 50, escuro com pouca iluminação, se via mais fumaça de cigarro que outra coisa. Ah! O nome do chefão do hotel, além de gordo, feio e com um bigode stalinista, se chamava Fred. Pois então, me dirigi à mesa do último chefão do Hotel Golden Palace. Cartas dadas é jogo começado. Fichas à mão, foi dado a largada. A última coisa que me lembro, era que eu estava saindo do hotel e de repente dois capangas me perseguiram e tive que sair correndo como um louco. Consegui meu primeiro dinheiro para o grande preço. Depois disso havia ainda mais três casas para jogar. Fui para casa para descansar, por sorte Mason estava livre para um jazz, vinhos e talvez um pôquer. Contei as peripécias que passei durante a minha estadia no Hotel Golden Palace, demos risadas e ele me contou suas histórias como gambler viciado. E quando Coltrane tocou My Favorite Things durante uma de suas vitórias no Grande Salão. Fiquei perplexo nessa hora. O Grande Salão era a high society dos masters do pôquer, só os faixas vermelhas jogavam lá e ainda Coltrane no palco tocando seu sax durante a vitória de Mason, era simplesmente magnífico. Mason foi agradecer a Coltrane pela belíssima música tocada na hora do último carteado, e ele deu de ombro, dissera que era inaceitável que o Grande Salão fora manchado com pôquer. Mas pelo menos Mason saíra de lá vitorioso e teve a sua foto na parede. Muitos dos high prices nunca conseguiram essa façanha, somente o antigo big daddy.

No dia seguinte ainda havia mais três casas para vencer. Tomei coragem e voltei ao meu trabalho num escritório de advocacia com um chefe cego que mais parecia ver coisas. Era o alguma coisa e associados, não lembro o primeiro nome, não do meu chefe, mas do escritório. Fazia um bicos de office boy, levava papel pra lá e pra cá e ficava subindo e descendo escada com um carrinho. Ouvia meu chefe falar o dia todo que eu tinha que ver o bem nas pessoas, coisa que ele tinha mais dificuldade para fazer, não me pergunte porque. Sentia mesmo que ver o bem me ajudaria a vencer big daddy, mas a astúcia e a coragem falavam mais alto. Saía do escritória no final da tarde e já me dirigia para a casa seguinte. Se eu venci o Fred, conseguiria vencer qualquer chefão pequeno. Apesar que, na casa seguinte tinha os mais ferrados dos jogadores, pessoas que não tinham nada a perder, então minha vida corria riscos. Mason me advertiu dizendo que eu deveria levar um colete a prova de balas e uma arma, levando em conta que não entraria com ela na calça, mas o colete foi me permitido. Essa casa tinha um dos mais psicóticos dos chefões. Na parede atrás dele tinha o Robotnik esgoelando o Sonic, o meu jogo favorito. Sentia minha vida se esvaindo com essa imagem, eu virava o Tales toda hora na mesa, pequeno e sem utilidade. Jogo começando e cartas nas mãos, fichas voando à todo momento e um ar de quero ligar pro Mason e pedir pra ele chamar a polícia. Perdia as vezes para não dar na cara. Quando sobrou eu e o Robotnik, tentei virar o super Tales mas não deu certo, tomei um soco de realidade no meio da cara e perdi metade do que tinha apostado, saí de lá arrasado, mas pelo menos vivo. Não queria falar com Mason e nem com a Daphne, a patricinha ruiva da minha rua. Fui pra casa, tomei banho e fui pra cama.

Na manhã seguinte, Mason me ligou marcando um almoço e fui ao encontro com ele, nesse dia meu chefe viu o lado bom das pessoas e não abriu o escritório. Fui pro restaurante com Mason e comemos como se não houvesse amanhã. Contei o que houve durante o jogo e descobrimos o porque eu perdi. Tive medo. Sempre zerei Sonic com um record alto, mas na mesa de pôquer não foi pular em cima de coisas, na verdade pularam em cima de mim e fiquei sem argolas douradas. Voltei atrás e tentei de novo, agora com mais coragem, argolas e determinismo. Venci o Robotnik e libertei os animaizinhos e todos viveram felizes para sempre. Saí de lá com o cú numa mão e na outra as fichas. Voltei pra casa e levei umas vinte e tantas horas pra cair as fichas que eu tinha vencido, depois dessas tantas horas, liguei pra Daphne para sairmos e possivelmente transarmos, ela aceitou como seu tivesse vencido o Round One. É claro que contei pra ela o que havia acontecido e pelo menos consegui sair, a transa ficou pra outra hora, ela dá mais atenção para seus amigos estranhos que mais se preocupam em perseguir monstros com um cachorro e um cara chapado.

As duas casas seguintes, foram mais simples, não fiz muito esforço. Juiz Mason já se aposentara, na verdade por força maior, afinal, descobrira que tinha um câncer no fígado, o que não ia fazer falta se perdesse, brincadeira. Passava mais tempo na casa de repouso emitindo pareceres para julgamentos e assistindo o jogo da roleta. Eu ia visita-lo sempre que podia e contava minhas vitórias e como eu queria transar com a Daphne. E ele me dava sermões e conselhos inúteis, como se fosse transar, deixasse ela ficar por cima, não me pergunte porque, ele nunca me disse o porque. Ele passava cantada e a mão nas enfermeiras que lhe davam tapas nas mãos, tomava os remédios com exatidão, já estava perdendo a memória e não se lembrava que os Red Sox tinham ganhado no ano passado. Pra ele o time já estava acabado há décadas. Senti que agora a vitória contra o big daddy, seria para o orgulho de meu melhor amigo o juiz Peter Mason. Juntei minha coragem, meu determinismo e minhas economias e o que eu tinha era suficiente para entrar na mesa contra meu maior inimigo. Os grandes high prices vinham assistir essa tão cobiçada empreitada. O Round One estava finalmente começado.

Nenhuma das quatro casas, chegavam aos pés das instalações do big daddy, fazia inveja em qualquer um dos low profiles que eu conhecia. Enfim, mesa pronta, cartas dadas e fichas à postos. Rolando um grupo de jazz ao fundo que tocavam bem calmamente para não estragar o jogo. Olhos atentos em todos os cantos, meu coração batia numa frequência que só a gente sabe. Equalizei minha calma para a opção “não surta”, e permaneci o mais calmo que eu podia. Um dos high price já havia saído, faltava mais dois e big daddy. Numa jogada de mestre, big daddy dispensara um dos concorrentes e sobrara eu mais um, que foi facilmente vencido. Big daddy se orgulhara de mim de tal forma que me oferecera um cargo de analista de mesa sem ao menos vencer, função: analisar se realmente vale a pena jogar em tal mesa. Fiquei pensativo, mas logo voltei ao jogo, queria vencer de qualquer jeito. Quando abrira a última mesa fiquei com o coração na garganta quase perdi a respiração. Quando big daddy apostara uma quantia alta recuei na minha analise, senti que perdera a minha vaga. Apostei o que era obrigado, e big daddy mostrara suas cartas e por um milésimo de segundo meu coração parou, senti minha vida passar pelos meus olhos em quanto big daddy juntava as fichas, e por um impulso do destino, parei e olhei as cartas na mesa e consegui pensar em algo útil, tipo “será que eu vou conseguir transar com Daphne? Será que acabarei com as diferenças entre low profiles e high prices? E se o juiz Mason estava ainda passando a mão nas enfermeiras? De todas as perguntas, consegui responder uma: Mason era realmente um safado. As outras perguntas deixei em branco, e fui reprovado com nota baixa. Mas voltando à mesa de pôquer, big daddy já tinha tirado as fichas e guardado numa maleta quando eu acordei depois de ter babado no meu braço, peguei as cartas molhadas de saliva e joguei na mesa e big daddy ficara paralisado com aquilo, esfriou todo seu intestino e foi subindo pelo estômago e depois pelo esôfago até os dentes. Parecia uma estátua de gelo quando levantei e peguei a maleta com uma quantia que me faria transar com a Daphne pra sempre no Hotel Golden Palace.

Saí de lá vitorioso.

1ºP.S: Ah! Agora me lembrei o que aconteceu no hotel. Enquanto eu jogava, uma garota loira passeava pelo salão e distraia os jogadores. Nunca disse, Daphne tinha uma irmã gêmea, a Penélope, apesar de loira era charmosa como. Ninguém conhecia a tal garota e passei uma cantada nela, e todos ficaram assustados como eu, um low profile desse nível pode conhecer uma garota linda assim.

2ºP.S: Juiz Peter Mason falecera semanas depois que eu ganhara a bolada do big daddy. Casara com uma enfermeira que fora abusada inúmeras vezes por ele. É claro que a noite de núpcias não acontecera, pois se tomasse um viagra morreria de enfarto. Bom, foi exatamente o que houve. Como disse, o resto é história.

3ºP.S: Eu me casei com Daphne e tivemos vários filhos, o mais velho chamava-se Peter Mason. Continuei no pôquer por mais alguns anos e depois larguei e fui trabalhar no campo, onde construímos uma casa e criamos nossos filhos. Daphne ainda tinha contato com seus amigos estranhos com um forgão misterioso. Penélope não mais caminhava pelos salões do Hotel Golden Palace, agora ele aprendera a jogar pôquer e virou a nova chefona do hotel de luxo. Ninguém ganhava dela nem mesmo eu, pois não podia passar cantada nela mais. Anos mais tarde fui promovido a novo “big daddy”, outros me chamavam de “big Roger”.

Alfredo José Durante
Enviado por Alfredo José Durante em 27/04/2016
Código do texto: T5617800
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