O sacrifício

Estava escuro e o vento forte balançava loucamente a cortina da janela.

Ela olhou por entre o vai e vem do tecido e viu dois postes apagarem consecutivamente suas luzes. Não gostava quando isso acontecia, parecia um mau presságio.

O rádio sintonizado estava com estática e ela o desligou esfregando as mãos como se o toque as tivesse queimado.

Olhou o relógio na parede, as horas passavam angustiantemente lentas, forçou os olhos para ver se o ponteiro dos segundos estava funcionando. Quanto tempo ainda teria que esperar? Havia momentos em que pensava que não conseguiria aguentar! Precisaria abreviar o suplício?

Uma rajada forte de vento derrubou o vaso de rosas no chão, a água que ensopou o tapete lhe lembrou sangue. E o susto que levou a fez pular e sufocar um grito na garganta.

Era preciso aguentar apenas mais algumas horas, logo amanheceria.

Andou pelo aposento, mas a dor em suas entranhas a incomodava. Nunca acostumaria com ela. Fazia parte do sacrifício.

Pensou nos encontros de família, as comemorações, nos amigos. Lembrou do tempo da formatura, o baile e do seu vestido vermelho...

Uma lágrima rolou solitária pelo seu rosto e num ataque raivoso e decidido olhou pela última vez para o relógio e se dirigiu para a cozinha, da gaveta escolheu a maior faca que pode encontrar, seria sua vingança.

E num gesto único e firme abriu a geladeira e cortou metade do pudim de leite. Que se danasse a dieta.

No outro dia doaria o vestido vermelho.

Tânia Mara Paula
Enviado por Tânia Mara Paula em 08/10/2016
Reeditado em 26/12/2017
Código do texto: T5785771
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