Um puta cara de sorte

- Machismo é um caralho! – Falei, exaltado, olhando nos olhos de Ana. – Machismo é um caralho.

Ela reagiu ficando de pé e me encarando. Nem por um segundo se encolheu. Eu sabia que no fundo só tinha jogado gasolina numa fogueira já acesa.

- Olha, Ana – Continuei. – Eu amo a forma que você luta pelo que acredita e que esteja engajada em tantas coisas. Eu acho que você é uma mulher maravilhosa, mas não reduza tudo que eu faço ou falo a esse tipo de coisa.

Ela me olhou, um pouco mais calma e falou.

- Não estou reduzindo.

- Não está? Tem certeza.

- Tenho.

- Veja só. Eu não sou nenhum desses “feministos” de internet que sabem exatamente o que falar para não desagradar nenhuma mulher e soarem como caras compreensivos e desconstruídos... mas porra, eu sempre te tratei de forma decente. Eu sempre te respeitei. Sempre te dei espaço pra se expressar e sempre estive aberto para diálogo... e não acho que eu mereça uma medalha por isso. Podemos não concordar em tudo na vida, mas não me venha rotular e me botar na mesma cesta que esse bando de bosta que se vê por ai.

- Não é o que eu estou fazendo.

- Todo mundo vacila na vida, alguns por ação, outros por inação. E certas coisas a gente absorve por osmose e solta sem pensar.. Não é por que eu ri de alguma piada de gosto duvidoso que mereço o rótulo.

- Acho que essa conversa não vai dar em nada.

- Talvez não dê mesmo... Me desculpe por ter me exaltado.

Beijei Ana no rosto e me sentei novamente na cama.

Ela deu uma volta pelo quarto e voltou-se em minha direção.

- Odeio quando você grita. – Ela me disse, visivelmente chateada.

- Eu sei. Me desculpe. Mas eu quase nunca grito, você faz bem mais do que eu.

- Por isso mesmo. Quando você se exalta é porque está realmente incomodado.

- Não gosto de ser rotulado. Me faz pensar que eu falhei.

- Falhou em que? – Ela disse se aproximando e sentando-se do meu lado.

- Em me diferenciar dos outros. De coisas e pessoas que desprezo.

- Não acho que você precise se sentir assim.

- Mas é assim que eu me sinto.

Ana puxou minha cabeça e deitou em seu colo e ficou mexendo no meu cabelo.

- Você é um dos caras mais doces que eu conheço.

- Não sei onde você vê isso em mim.

- Você consegue ser sensível em momentos que eu não espero. Vê coisas em mim que ninguém vê. Fala coisas que ninguém fala. Me arranca sorrisos quando eu queria chorar. Me faz chorar e sorrir ao mesmo tempo com as coisas que escreve.

- Caramba. Eu não sabia que eu podia fazer isso tudo.

- E às vezes você pode ser um pé no saco também.

- sei que posso – Disse, beijando sua barriga.

Ana riu e eu pude ver o arrepio correndo-lhe pelos braços.

Ela era extremamente sensível na região do ventre. Qualquer coisa lhe fazia se contorcer de cócegas... Eu adorava isso nela.

Ela deitou-se e eu sentei ao seu lado, expondo-lhe a barriga.

Não restava nenhuma fagulha da ira de alguns minutos atrás. Nem nela, nem em mim.

Não era fácil estar com uma mulher de personalidade tão forte. E com certeza não era fácil conviver comigo. Mas o tempo ia provando que fazíamos um bom par. Dia a dia íamos aparando as arestas que surgiam e quando desentendimentos apareciam, logo dávamos um jeito de resolvê-los. Para isso, tive que me acostumar com seu temperamento explosivo e ela com minhas mudanças de humor.

Eu era apaixonado pela forma que ela defendia as coisas que acreditava. Perdoava-lhe os exageros e fazia o meu máximo para não entrar em batalhas ideológicas... o que sinceramente era um progresso para mim, já que eu sempre tive uma queda para esse tipo de coisa. Ela, por seu lado, tolerava minhas frivolidades de escritor, meus devaneios de geminiano e minha tendência para o drama.

Perdido em meus pensamentos, fui aos poucos levantando-lhe a blusa. Expus-lhe os seios e ela me deu um sorriso.

- Você está impossível hoje.

Realmente eu estava.

- O que é que você quer que eu faça? Estar contigo é bastante estimulante.

- Me pergunto até quando você vai achar isso.

- Não penso num prazo de validade.

- Todos os homens sempre terminam se afastando.

Me posicionei bem acima de seu corpo, apoiado em meus braços e aproximei meu rosto do seu.

- Eu não sou eles.

Ela sorriu, um pouco constrangida enquanto aproximava cada vez mais os meus lábios dos seus.

- Eu sei que você não é... mas mesmo assim eu tenho medo.

- Aposto que você vai enjoar das minhas rabugices e me trocar por um cara com metade da minha idade e que beba metade do que eu bebo.

- Não tá fácil encontrar alguém assim... – ela riu.

Nos beijamos...

Ela puxou meu corpo contra o seu e prendeu meu cabelo com os dedos. Eu podia sentir seu coração disparado...

Aquela mulher me amava, dava pra perceber.

Só por isso, eu sabia que eu era um puta cara de sorte.

Rômulo Maciel de Moraes Filho
Enviado por Rômulo Maciel de Moraes Filho em 09/12/2016
Código do texto: T5848281
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