AFAGO

Não queria mais passar por aquele lugar. Trazia muita tristeza, lembranças doídas, imagens que desejava esquecer. Mas naquele dia precisou estacionar o carro passando bem em frente ao necrotério. Olhou para o lado, viu aquele prédio, carros de funerárias estacionados logo em frente.

Lembrou de cada detalhe daqueles dias tão recentes ainda. Sentiu-se nervosa, insegura, aflita, assustada.

Enquanto seu marido dirigia, ela cruzou as mãos e as apoiou sobre as suas pernas e apertou os dedos uns contra os outros, como se isso fosse trazer alguma força. Sentiu que ia começar a chorar. Nesse momento, o carro precisou parar por causa das manobras dos automóveis que serviam à funerária. Então ela pensou: não, parar aqui não. Fechou os olhos.

Foi aí que ela sentiu um afago em suas mãos. Abriu os olhos e viu aquela mão tão conhecida. O formato dos dedos, alguns tortos pela artrose. As manchas senis, a pele um pouco enrugada pela idade. Logo percebeu que eram as mãos do seu pai sobre as suas. Delicadamente esfregou as mãos dele sobre as dela como se quisesse dizer que confiasse, que tudo daria certo.

Não foi preciso buscar seu rosto. Apenas deixou-se levar pelo calor daquelas mãos e aquele afago. Ficou tão feliz que escapou um pequeno sorriso.

Mas, de repente, acordou. Havia sido só um sonho. Se viu de novo diante da realidade. Seu pai não estava ali, nunca mais. Foi um bom sonho. Parecia que podia senti-lo. E ela novamente sorriu...

Mariza Schröder
Enviado por Mariza Schröder em 27/12/2016
Reeditado em 27/12/2016
Código do texto: T5864222
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