ESTAVA OU ESTÁ ESCRITO?!...(cont.)

TEXTO 4

MAKTUB - DESTINO

Há quem fale em destino. Há quem fale em livre arbítrio. Se há uma dualidade paralela, não sei. A palavra MAKTUB é árabe, quer dizer ‘carta’ e ao mesmo tempo significa ‘estava escrito’, conotação divina das escrituras e indica profecia ou destino. A palavra ALCORÃO deriva de um verbo que significa ‘declamar’ ou ‘recitar’: palavra literal de ALÁ (Deus) revelada ao profeta MUHAMMAD (Moisés) ao longo de 23 anos. Segundo o ALCORÃO ou CORÃO, livro sagrado dos muçulmanos, a vida de todos nós está no Grande Livro do Destino, seja algo bom ou ruim. // Fora do sério (fora de série é outra coisa): “Se-correr-o-bicho-pega-se-ficar-o-bicho-come”... - frase popular em letra de música brasileira. Não estou pregando religião e sim questionando o destino (?) de duas FRIGIDEIRAS. O leitor entendeu direitinho: aquele vasilhame da cozinha, “pouca estatura”, onde fritamos ovos, bife, peixe, pedaços de frango, lingüiça, queijo......... Chega! Água na boca ou indigestão no leitor? // Estória antiga. Na sexta-feira que antecede o carnaval de 2012, ELE e ELA foram ao supermercado - escolheram um famoso, grandão, em estrada não longe de casa, não caminho fácil de ônibus ou clientela a pé, hipótese de não estar lotadíssimo. Ainda VERÃO? Fevereiro, quase OUTONO. Muito calor. Tempo especial das mulheres em roupas curtas ou super decotadas ou de alças ou... sem alças.. No estacionamento, foram abordados por um rapaz de aspecto comum, enorme sacola de couro ao ombro, cheiona, aparência de muito pesada. Declarou ser passista numa escola de samba e estava no ramo de vendas na rua para ajudar na fantasia. Justamente a escola que ELA amava e logo sentiu na boca o sabor da fruta verde e rosa. Quatro FRIGIDEIRAS por 49 reais. Não alumínio de primeiríssima qualidade, mas ELA comprou - duas para a casa dela, duas para a casa do primo. Aí, bateu aquele silencioso sentimento de profecia: “Não vou usar. Não serão minhas!” Sem querer, pensamento numa outra prima, solteira-viúva, porque na véspera do casamento o avião teco-teco do noivo, super medalhudo de natação internacional, trazendo o vestido rendado, caiu no mar. Por uns três dias disseram: “Triste destino!” Dele? Ou dela? // As FRIGIDEIRAS ficaram no carro. // Dentro do mercado, um casal moreno e uma criança de uns dois anos. A mulher usava um xador negro, aquela veste feminina que cobre o corpo todo. Caminhava atrás do marido bem mais velho e do filhinho, a passos talvez cronometrados. As duas mulheres se olharam bem de pertinho, minha AMIGA super exposta, a estrangeira num sorriso triste, uma lágrima caiu do olho esquerdo (lado do coração) e esta apenas balbuciou para a brasileira o clássico “MAKTUB”. Casamento provavelmente forçado. (Arranjado seria mais suave - pessoas com algo em comum.) Quantas outras esposas, todas oficializadas e estáveis? ELA apenas pensou: “Eu, hein? Cada terra com seu uso, cada roca (instrumento para fiar a lã) com seu fuso.” Sacudiu-se e jurou não comer quibe nem kafta com hortelã (somente naquele dia!), no tradicional lanche após as compras. // Passemos ao MAKTUB exclusivo das FRIGIDEIRAS dela. // Carro foi lavado por fora e por dentro no sábado, rapaz do posto tirou o que estava nos bancos - jornais, chinelo de borracha, um pacote de biscoitos etc. - colocou de lado e na hora de entregar o carro lavado quase esqueceu duas (as dela?) FRIGIDEIRAS no balcão. “Desculpe!” Entregou. // Mora sozinha. Não viajou nem assistiu carnaval inteiro pela televisão, ou seja, aparelho ligado na sala para o sofá vazio, ELA ocupada ao notebook no quarto, escutando... Arranjara há quase seis meses uma atividade literária, pesquisa para roteiros, esqueceu o mundo momesco. Descongelou refeições e salgadinhos, aqueceu, assou, não fritou nada. Numa etiqueta, as FRIGIDEIRAS deveriam ser untadas com gordura, aquecidas, lavadas com detergente, só depois é que poderiam ser usadas. Levou um mês para lembrar das tais. Lembrou, passou óleo, deixou na beira da pia, foi escrever e-mail, entrou no bate-papo, voltou horas depois, ambas coalhadas de formigas - lavou, enraivecida consigo própria, guardou. Recebeu visita importante, AMIGO do interior paulista que amava peixe, trouxe corvina, trilha e camarão da feira-livre; hóspede telefonou do aeroporto, agradeceu carinho, mas lembrou a ELA que não comia nada frito - ainda não foi dessa vez a estréia... Outro dia, comprou filé mignon especialíssimo, iria inaugurar as ‘encantadas’, demorou na rua, almoçou variedades no restaurante a quilo - embalou, etiquetou com nome-data, congelou a carne. Temporariamente as FRIGIDEIRAS - possíveis eternizadas virgens como eram as vestais da Roma Antiga, mas de fogo pessoal ainda não aceso (esclarecendo: nunca poderia ser extinto o fogo das piras dos templos, gente maliciosa!) - desapareceram. Como isto aconteceu? Roubadas, não. Sem explicação lógica, ilógica tem. Veio uma faxineira íntima, as duas trabalharam juntas na limpeza da casa, de súbito a visitante por minutos com as “benditas” (?) FRIGIDEIRAS na mão, entregou à dona da casa, esta passou margarina, nisto chegou o carteiro, carteiro segurou-as no ato de assinar, devolveu-as, choveu, tudo com a rapidez da uma piscadela (ou raio na chuva forte?), fez bruto frio repentino, as tais agora com a faxineira - casaco na parte alta do armário, moça subiu de repente na escadinha doméstica “onde-colocar-por-um-minutinho-as-frigideiras?” - exato: colocou em cima do armário, levou o casaco para baixo. Muito tempo depois, veio um homem envernizar o armário, esvaziou, arrastou, barulho metálico em cima, ‘o-que-é-o-que-não-é’... reapareceram. Deu trabalho relembrar o acontecido na tarde de INVERNO - Rio de Janeiro, sempre calor. Veio a PRIMAVERA. Coleção de receitas culinárias, sugestão de panquecas... com flores. “Finalmente hoje!” Violeta, rosa, amor-perfeito. Uma beleza. (Opinião dela - EU não estava lá, não suportaria os exóticos sabores ‘perfumados’.) Telefone tocou, trote mal elaborado (...ELA tendo sido sequestrada...) - distraiu-se com o “resgate” insignificante e... usou as FRIGIDEIRAS... antigas. // Bom, nem sempre o mordomo é o culpado. Pode ser um escritor (sério, honesto, 1-ponto-8-ponto-0, jaqueta marrom), também, por que negarei? “Criminoso”casual, “assassino” de duas FRIGIDEIRAS, nunca estreadas! Cheguei como visitante, Alguém me hipnotizou, só pode ser. Não foi a Medusa porque não me transformei em estátua grega de pedra. Pelo sim pelo não, coloquei as “irmãs quase siamesas” numa sacola plástica e levei-as para fora da casa, deixei num cesto metálico suspenso na calçada. O carro recolhedor é daqueles que esmaga tudo... as FRIGIDEIRAS em segundos ”já eram”......

Vaticínio cumprido após um tempo comprido.

Posso entortar o provérbio? “O que é do homem, o caminhão do lixo come!”

NOTA DO AUTOR:

CURIOSIDADE CULTURAL - Prática mundialmente generalizada nas sociedades muçulmanas: o ALCORÃO não deve ser vendido e sim dado. Um dos livros mais lidos e publicados em todo o mundo, a para com a Bíblia.

XADOR - Traje persa antigo, uso documentado desde o século XVIII.

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 14/10/2017
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