Memórias de Um Andarilho
Ando pelas ruas de uma cidade cheia de encantos e mistérios. Começo pelo Fragata que é cheia de vida e bastante movimentada.
Passo pelo cemitério e observo os túmulos das pessoas que fizeram a história de Pelotas, recordando-me das aulas de história que tive com um professor que contava os seus feitos heróicos com um entusiasmo contagiante. Parecia que fazia parte dessa maravilhosa aventura, mas tudo era apenas imaginação da minha cabeça.
Sigo em frente. Lembro-me de minha tênue infância, dos jogos de futebol com meus amigos na quadra de esportes do quartel, das brincadeiras nas pracinhas e do primeiro amor que tive em minha vida. São bons tempos que não voltam mais.
Vou agora pra uma longa avenida onde vejo com tristeza que o local onde me divertia na minha adolescência agora tinha um enorme ginásio e estava totalmente cercado. Disseram-me que não podia mais entrar ali.
Recordo-me dos encontros com meus companheiros em uma antiga quadra de basquete que havia neste local com uma tabela de madeira, imaginando grandes jogadas e sonhando ser Magic Johnson ou Michael Jordan. Uma lágrima rolava em meu rosto ao relembrar essas reminiscências.
Chego ao centro da cidade e olho para os prédios antigos com curiosidade, lembrando-me dos meus tempos de estudante aonde eu ia pra Biblioteca Pública devorar os livros de aventureiros românticos e pesquisar sobre a história de Pelotas ou de um determinado prédio nos jornais e alfarrábios da época.
E novamente recordo-me de um lugar que me marcou muito que era um sebo muito famoso na cidade. O Sebo do Janjão com suas revistas em quadrinhos, enciclopédias e livros de que eu tanto gostava e muitas vezes sempre acabava comprando Pato Donald, Mickey ou a enciclopédia Barsa, entre outros.
Hoje, o lugar se tornou um restaurante. Quando lembro disso, outra lágrima rola em minha face.
Sigo agora para a Praça Coronel Pedro Osório que está praticamente vazia e silenciosa. Olho para as árvores que embelezam o local e sento em um dos bancos, contemplando a Biblioteca e o Grande Hotel e pensando o quanto esses locais tinham para mostrar aos seus visitantes.
Para mim, no entanto, nada mais restou. Somente lembranças de tempos idos.
Resolvi então seguir meu caminho rumo ao Porto e chegando lá, sentei-me a beira do canal e mergulhei em mais recordações.
Lembro-me agora das conversas com meu pai, onde contava sobre a prosperidade desse local com as fábricas funcionando a todo o vapor e os caminhões entrando e saindo com as cargas destinadas para outras cidades. Olvebra, Anglo e Cosulã eram lembradas com muito orgulho pelo meu velho. Falava também que sempre esperava meu avô chegar do trabalho com o presente que trazia para ele. Às vezes eram doces, em outras brinquedos e na noite de Natal, ganhou uma bola de tento. Aquilo era mágico pra ele e logo começou a jogar com os amigos, imaginando ser Galego ou Bedeusinho.
Emociono-me novamente ao lembrar-me dele. Era uma pessoa muito compreensiva comigo e que morreu num trágico acidente de ônibus alguns anos atrás. Ficou somente suas recordações.
Sigo meu caminho até a Baixada lembrando agora dos jogos que eu assistia ali do Brasil com a charanga que batia forte seus instrumentos, dos gritos de incentivo da torcida aos seus guerreiros que honravam a camisa vermelha e preta jogando sempre com raça e vontade de vencer e dos clássicos que movimentavam a cidade e mobilizavam todos os torcedores, especialmente o Bra-Pel.
Meu pai me levava pra assistir aos jogos e eu sempre via alguns meninos que não podiam entrar por serem pobres. Gentilmente os deixava entrar junto conosco com a condição de não fazer muito alarde para que os policiais não os mandassem embora e todos ficavam muito felizes ao assistirem aquela magnífica partida.
Peguei um ônibus e resolvi ir até a praia do Laranjal, que estava bela e resplandecente como sempre fora.
Sento-me em um dos bancos na calçada e contemplo a lagoa, recordando-me dos banhos que tomava todos os verões, dos crepes que comprava nos trailers pra comer depois do almoço de domingo e das caminhadas matutinas que fazia com minha mãe na beira da praia.
Tudo isso agora são apenas memórias de uma época em que vivia muito feliz. Hoje vivo sozinho e triste peregrinando sem rumo por esta cidade.
A noite cai e fico sem forças para continuar andando. Deito-me na areia e sonho que estou em casa, junto com minha família e amigos, saboreando os doces de minha avó e lembrando as histórias que meu pai e meu avô contavam para mim.
O dia amanhece e sigo meu doloroso caminho de volta para a cidade. Percebo que ela está em festa e vestida com a melhor roupa que tinha para me recepcionar depois desta longa viagem.
Outra lágrima rola em meu rosto. Agora de alegria, pelo fato de poder participar da festividade, mesmo receando que acontecesse o contrário.
Ela sorri e me mostra os seus encantos. E descubro que Pelotas realmente é meu lugar e minha paixão.
E é nela que ando a procura da felicidade e da alegria que outrora perdi.
Sigo nessa caminhada movida a lembranças e memórias.
Será que um dia as terei de volta?