DE-PREMERE

(Se possível, leia o texto abaixo com a música "Na Laetha Geal M'oige" da Enya ao fundo)

Ela chega de mansinho e a convido para um chá.

- Não gosto de chá!

- Não importa.... Gostaria apenas de conversar com você um pouco.

- E sobre o que quer falar?

- Talvez eu queira ouvir...

- Não tenho o que falar.

- É possível absorver os dias sem perder pedaços da Esperança?!

- Não tenho essa resposta!

- Me sinto frágil com sua presença...

- Não carrego em mim força alguma.

- Mas sinto sua força.

- Isso não é uma força.

- O que é?!

- Dores...

- Eu as criei?!

- Talvez tenha criado algumas.... Talvez seja sensível a outras...

- Me sinto perdido...

- Talvez procure respostas demais...

- Se a questão fossem só as perguntas.... Já fiz o exercício de ignorar muitas.

- Não tenho conselhos para te dar.

- Não quero conselhos.... Queria entender porque você aparece sem avisar.

- Talvez queira entender mais do que consegue. Todo excesso traz consequências excessivas.

- Você é meu excesso?!

- Não procuro entender o que sou.

- Seremos amigos algum dia?

- Pareço uma inimiga?!

- A considero um Anjo Triste...

- Anjos são seres celestiais.... Não sinto que pertenço a tal classe.

- Mas não a considero minha inimiga.

- Talvez seja estranho, mas não quero lhe fazer mal.

- Não é o que sinto.

- Vou tomar o seu chá...

- Você parece indecifrável para o mundo.

- Há muito tempo o ser humano não entende muitas coisas, mas se gaba por se achar o ser mais inteligente do Universo.

- Estou tentando te entender.

- A compreensão humana não poderá me absorver.... Compreendem partes avulsas...

- Algum dia te direi ‘adeus’?!

- Você já me deu vários ‘até logo’...

- Por que você volta?!

- Vai se culpar?!

- Queria saber como manter a porta fechada!

- Desculpe.... Eu lhe quero bem.

- Não é o que sinto.

- Nem toda dor é dor realmente.

- Às vezes acho que me acostumei com você.

- Onde estão seus comprimidos?

- No chá que você tomou...

- Era isso que você queria?!

- Queria apenas que pudesse sentir um pouco do que eu sinto.

- Talvez algum dia eu lhe mostre lugares desconhecidos.

- Talvez eu queira, algum dia, conhece-los...

- Preciso ir...

- Há tempos você não vai embora. Irá agora?!

- Difícil dizer.... Estou sempre por perto.

- Talvez seja isso que me fez chama-la de ‘Anjo’.

- Não tente entender tudo e todos.... Não tente consertar o mundo com as próprias mãos.... Não perca os momentos da vida...

- Está me dando conselhos?!

- Não.... Estou apenas lhe mostrando que por mais que eu pareça forte, ainda sou vulnerável.

Assim, ela se levantou calmamente e antes que atravessasse o portão, perguntei: “Qual o seu nome?” Ela parou.... Olhou as estrelas... E por um segundo vi seu olhar perdido no horizonte. “Importa?!” Perguntou e foi-se sumindo na escuridão.

BH 09/07/2015