UMA FORMA INUSITADA DE ENSINAR
Até o término da faculdade de administração, aos 21 anos, os estudos sempre estiveram em primeiro lugar na vida de Lucas. Festinhas, sair com amigos, namoradas não estavam em seus planos, enquanto não concluísse o ensino superior.
Formado, não foi difícil conseguir um bom emprego. Seu histórico escolar era invejável. Então, pensou na vida para além dos bancos escolares e festejou com os amigos. Conheceu o mundo das baladas e conheceu garotas. Inexperiente, logo apaixonou-se por uma bela jovem. Isabela era linda, uma princesa, mas tinha apenas 16 anos. “Muito nova para casar” pensou e ele não desejava ficar muito tempo solteiro. Tanto que já comprara e mobiliara um apartamento, no qual morava.
Isabela também apaixonara-se por ele. Todavia casar, assim, tão cedo, não estava na sua lista de prioridades. Queria gozar mais uns tempos, da liberdade que tão arduamente conquistara, há pouco. O mundo das festinhas, dos amigos, das baladas, no qual gravitava há apenas um ano, porque antes seus pais não permitiam, a fascinava. E Lucas já demonstrara que seus objetivos miravam outros caminhos.
O namoro, no entanto, continuou, embalado pela magia da paixão. Lucas conheceu os pais da bela namorada e os conquistou. Convencê-los a permitir o casamento precoce da filha não foi tarefa difícil, de forma que, cinco meses depois, estavam casados.
Após a licença gala, Lucas, que já contava com ano de trabalho, ganhou mais trinta dias de férias. Tempo durante o qual viajaram e curtiram seu apartamento.
Isabela não sabia fazer absolutamente nada em casa e não demonstrava a mínima vontade de aprender. Lucas, por seu turno, não julgou que esse fosse um obstáculo para a relação. Com o tempo, ele haveria de convencê-la a se interessar pela vida doméstica. Claro que a participação dele seria efetiva em todos os afazeres. Enquanto gozava das férias e da lua de mel, porém, ele iria fazendo tudo e mostrando a ela como funcionava.
Estava tentando ensiná-la. Ele acreditava nisso.
No primeiro dia da volta do trabalho, para o almoço, Lucas encontrou Isabela deitada no sofá, brincando com o gato e nada de almoço. Nem a louça do café da manhã ela lavara. Não gostou, mas olhou para ela, ali, deitadinha no sofá, exuberantemente bela, brincando com o gatinho... Era sua esposa, por quem estava apaixonado. “Deixa pra lá, eu faço tudo”, pensou. E lavou a louça, fez o almoço, almoçaram. Depois beijou apaixonadamente sua princesa e saiu para o trabalho.
À noite, na volta para casa, encontrou-a deitada no sofá, brincando com o gato e a louça do almoço na pia.
“Não é possível! ” pensou, mas nada disse. E fez o que ela deveria ter feito.
Nos três dias seguintes, a cena se repetiu e ele nada disse. Estava apaixonado e não queria magoar a esposa. No quarto dia, comprou o almoço e trouxe para os dois. No quinto dia, repetiu o ato, depois procurou sua mãe, a quem contou a história e pediu conselhos.
- Olha aqui, meu filho, não devo interferir na vida de vocês. Casaste por tua livre vontade com uma adolescente desmiolada, imatura, pouco mais que uma criança, que não sabe fazer nada, porque a mãe não ensinou. Agora, a responsabilidade de ensiná-la é tua. Um dia, ela aprenderá.
Lucas estava à beira do desânimo e a conversa com a mãe pouco ajudou.
Certo dia, voltava do trabalho, pensando: um mês, que aquela situação o angustiava ... hoje, não comprara o almoço. Ia chegar e encontrar tudo bagunçado, como sempre, sem comida feita, louça suja na pia e ela no sofá, brincando com o gato.
“Assim, não há paixão que resista”, concluiu e tocou a campainha da porta do apartamento.
Entrou calado, foi até o sofá, pegou o bichano, prendeu-lhe a cabeça no cano de uma bota e aplicou-lhe uma surra de cinto.
- Olha aqui, gato infeliz –disse, furioso, após o espancamento no pobre bicho - se amanhã, quando eu chegar para o almoço, o apartamento não estiver em ordem e o almoço pronto, voltarás a apanhar. Apanharás todos os dias, se necessário for. Estás ouvindo?
Virou as costas e saiu calado, para almoçar no restaurante, sozinho.
Foi a lição de que Isabela precisava. Nunca mais Lucas encontrou o apartamento desarrumado e a comida por fazer.
E os dois continuaram apaixonados e felizes.