O menino artesão.

O Menino Artesão

Era uma vez num pequeno povoado distante de toda a modernidade, um pequeno menino muito pobre que cuidava de sua mãe já velha e doente. Todos os dias ainda muito cedo, ele pulava de sua humilde cama e com sua carroça e com um pequeno e magro burrinho, ele ia até a floresta apanhar lenha para vender. Ele enfrentava com os pés descalços o frio, o vento e o medo, o medo de cobras e assombrações. E assim passava o dia mastigando frutas que achava pelo caminho, assobiando e conversando com os passarinhos. A floresta estava tão habituada a presença do menino que já não o desconhecia e revelava todo o seu encanto e beleza. O menino conhecia todos os cantos dos passarinhos que eram seus únicos amigos, eles assobiavam seus cantos e eles reconheciam, vinham e iam e se comunicavam como grandes amigos. No final de cada tarde, o menino arrastava a carroça até a única venda que havia por ali. E timidamente dirigia-se ao Seu Manuel, um velho ranzinza e miserável.

- “Seu Manuel, vai ficar com a lenha hoje?” – Seu Manuel com muita má vontade e sempre respondia:

- “Por 25 pratas! Pode deixá-las lá no fundo, menino.” - A carroça cheia de lenha valia no mínimo 40 pratas, porém, sem opção o menino concordava e nem dinheiro Seu Manuel lhe dava. Como sempre, o menino trocava seu dia longo de trabalho por alguns itens de mantimentos que ele alegremente levava para a casa para alimentar ele e sua mãe. Porém neste dia, Seu Manuel retrucou.

- “Já tenho lenha demais, menino. Todos os dias você vem com essas lenhas. E é lenha, lenha, lenha. Eu já estou farto desse lenga-lenga. Por que não traz outra mercadoria? Dizem que tu conversa com passarinhos. Por que não me traz um desses teus amiguinhos? Se cantar, um coleirinho do brejo por exemplo, vale muito mais que essas lenhas.” – O menino sem pestanejar responder logo:

- “Pego passarinho não, tenho pena deles na prisão.” – E triste, o menino dirigiu o olhar nas dezenas de gaiolas penduradas na venda de Seu Manuel e o velho só por maldade e vingança disse:

- “Então leve essas tuas lenhas de volta e volte quando mudar de ideia, menino.” – O menino muito aborrecido volta para casa com as lenhas, sem os mantimentos, com a carroça e seu burrinho. Sem o pouco que ele sempre trazia.

Aquela tarde parecia a mais sombria de todas. “E agora, o que vou fazer?”. Chegando em casa, muito triste, o menino se depara com sua mãe com uma linda toalha bordada nas mãos e antes que ele falasse qualquer coisa, a mãe sorri para ele.

- “A tantos anos, né, meu filho? Talvez nunca você viu esse trabalho de sua mãe.” – Na verdade, o menino nunca havia visto aquele sorriso. Então ele pergunta para sua mãe:

- “Que linda toalha, mamãe. Quem lhe deu?” – A mãe lhe responde:

- “Fui eu mesma que bordei, meu filho.”

- “Como assim, mamãe? Eu nunca te vi bordar.”

- “É, faz tanto tempo, tanto tempo, meu filho.” – E ela lhe conta uma história. – “Quando eu era menina, aprendi a bordar com a minha mãe, que aprendeu a bordar com a mãe dela e assim foi de geração a geração. Eu era uma boa bordadeira, então me casei, eu bordei muitas toalhas para ajudar seu pai com as despesas. Então um dia, eu engravidei e bordei o enxoval do bebê. Muito contente, eu sabia que era uma menina, mas quando ela nasceu, ela era muito doentinha e eu tinha sonhado a ensiná-la a bordar, assim como a minha mãe me ensinou. Mas infelizmente, a minha menininha não vingou e quando a minha bebezinha morreu, a minha tristeza foi tão grande que passei a nunca mais bordar. Então passei a trabalhar na roça e perdi o pouco da alegria de viver, então um dia você nasceu! Era forte, mas passou muito tempo. A vida era difícil, seu pai também se foi. A alegria apagou-se e a vida tornou-se isso, essa amargura. Porém essa noite, meu filho, enquanto eu dormia, eu tive um sonho. E nesse sonho, eu bordava e estava contente e feliz. Então quando me levantei, abri aquele velho baú que tem no meu quarto, aquele que nunca deixo você abrir. Então comecei a bordar e nem vi as horas passarem, então você chegou.

- “Mamãe, eu fico tão feliz de vê-la assim, feliz. Mas não tenho boas notícias. Seu Manuel não quer mais comprar as lenhas. Eu não trouxe nada hoje.”

- “Não importa, meu filho. Temos o que comer, amanhã será um novo dia!”

- “Mas mamãe, o que faremos? Ele disse que não vai mais comprar as lenhas. O que vou levar? Ele disse que devo levar outra mercadoria... Ele disse que devo prender passarinhos, mas isso eu não vou fazer não.”

- “Não se preocupe, meu filho. Vai fazer o seguinte: amanhã, você vai levar essa toalha. Certamente, o Seu Manuel vai se interessar. Uma toalha de mesa bordada a mão tem muito valor! Você leva e pede 200 contos, ele certamente vai desdenhar e oferecer menos, então você aceita em deixar a toalha por 100 contos. Você vai ver como ele vai aceitar e vai ficar tudo bem.” – O menino então sossegou seu coração e dormiu tranquilamente aquela noite, assim como é o sono dos justos.

Na manhã seguinte, logo cedinho, o menino fez conforme sua mãe lhe flou e ao invés de ir para a floresta pegar lenha, ele correu até a venda com a toalha em suas mãos. Então ele logo apresenta ao Seu Emanuel e o velho ranzinza logo lhe diz:

- “Roubaste esta toalha, menino?”

- “Não, Seu Manuel, eu não roubo não. Foi a minha mãe que bordou.”

- “Nunca soube que sua mãe bordava.”

- “Então, Seu Manuel, nem eu.” – E Seu Manuel que não era bobo nem nada, olha a toalha, vira a toalha, olha o avesso, passa a mão, vira de novo e vê que o bordado é perfeito.

- “Então faça a tua oferta. Eu pago 100 conto nessa toalha, nada mais.” – Então o menino logo sorri, fica impressionado e contente. Volta para casa com mais alimentos que o habitual e chegando, logo diz para sua mãe:

- “Mamãe, me ensina a bordar.” – E a mamãe com os olhos cheios de lágrimas diz:

- “É claro, meu filho.” – E contentes, mãe e filho passam aquele dia conversando e bordando. Logo o menino pela o jeito pela linha, agulha e o gosto pelo bordado. E passa a bordar com capricho e a produzir lindos trabalhos, acertando cada dia mais os pontos que sua mãe lhe ensina. Então, um dia ele diz a sua mãe:

- “Não conta pra ninguém, mamãe, que eu bordo, tá?”

- “Por que, meu filho?”

- “Porque bordar é coisa de menina!”

- “Não, não é não, meu filho. Bordar é coisa de artesão e arte não tem sexo! Você deve se orgulhar do que está fazendo. Você tem um dom, não é nada fácil bordar. Não é qualquer um que consegue levar o jeito com a linha e agulha. Então, ao invés de apanhar lenha, você pode bordar sim. E é tão prazeroso, você não acha?”

- “Acho sim, mamãe. Então, já que posso ser um artesão, eu vou ser o melhor artesão que já se viu por essas terras.” – E assim foi, o menino passou a bordar cada vez mais, os seus trabalhos ganharam fama, trouxeram prosperidade e nunca mais houve fome naquela casa. Seus bordados começaram a viajar o mundo e a cobrir mesas de reis e rainhas, um dia sua mãe se foi. Mas o menino ficou feliz com a herança mais bela e preciosa de todas: o trabalho digno.

E o menino cresceu, tornou-se homem e nunca deixou de bordar. Tornou-se um grande artesão daquela região, conhecido e reconhecido internacionalmente. Os seus bordados foram além de flores e frutas. Ele bordava a floresta inteira, os passarinhos eram sua maior inspiração, ele bordou uma história, uma história linda de superação. Ele bordou todas as coisas que amava dentro do seu coração.

Fernanda Ferreira Baylon
Enviado por Fernanda Ferreira Baylon em 23/03/2022
Código do texto: T7479262
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